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Chang não será responsabilizado em Moçambique por crimes julgados nos EUA

O Procurador-Geral da República disse, hoje, que Manuel Chang não poderá ser julgado em Moçambique, pelos mesmos crimes já julgados nos EUA. Américo Letela explicou ainda que o julgamento do  antigo ministro das Finanças não trouxe nenhum benefício a Moçambique, tanto pela pena aplicada, como pelo ressarcimento ao Estado. “Como se pode constatar, a pena que lhe foi aplicada é

Após contradições entre os co-réus Teófilo Nhangumele e Armando Ndambi Guebuza, sobre a comparticipação de Bruno Evans Tandane Langa, no calote das dívidas ocultas, hoje é a vez de este último réu deixar a sua versão em tribunal.

Amigo e sócio de Armando Ndambi Guebuza na empresa Mobimóveis, Bruno Evans Tandane Langa é dos nomes repetidamente mencionados pelos co-réus já ouvidos no julgamento do caso das dívidas ocultas, mas em situações divergentes.

Cipriano Mutota (réu já ouvido) explicou que concebeu o projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva com ajuda do seu amigo Teófilo Nhangumele. Este que, a dado momento, ficou responsável por convencer as autoridades moçambicanas a aprovarem o projecto que lhe tinha sido apresentado por Jean Boustani, do Grupo Privinvest.

Notando a demora na aprovação do projecto que Nhangumele apresentara às autoridades, decidiu, então, seguir por outras vias.

“Contactei o Bruno Langa. Eu já conhecia Bruno Langa, que não era meu amigo, mas eu sabia que ele era amigo de Armando. Eu disse, pergunte ao teu amigo Armando se, por ventura, o seu pai não tivesse recebido uma apresentação (sobre o projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva)”, disse Nhangumele.

E o processo deu seguimento, na versão de Teófilo Nhangumele. Versão que, em Tribunal, o filho do antigo Presidente da República, Armando Ndambi Guebuza, disse desconhecer por completo e que ele e o seu amigo Bruno não tratavam de assuntos do Estado.

“Nós tínhamos outro propósito que não era da Zona Económica Exclusiva. É por isso que nunca houve abordagem desses assuntos por parte de Bruno e senhor Teófilo para comigo”

Sobre a possibilidade de ele ter servido de ponte para o projecto chegar a Armando Guebuza, Ndambi disse que isso nem seria possível, mesmo que quisesse, porquanto o seu pai tinha canais próprios para receber projectos desta natureza.

A versão dada por Teófilo Nhangumele coincide, entretanto, com a acusação do Ministério Público, que aponta Bruno Langa como quem recebeu a chamada de Teófilo Nhangumele para falar com o seu amigo, Ndambi, de modo que este fizesse chegar a proposta da Privinvest de protecção da Zona Económica Exclusiva ao seu pai, então Presidente da República, Armando Guebuza.

Ter-se-ia também, segundo a acusação, integrado numa comitiva que seguiu viagem à Alemanha, em nome do Estado moçambicano, para apreciar a capacidade do Grupo Privinvest em protecção costeira, trabalho que lhe terá rendido 8.5 milhões de dólares.

Verdade ou não, Bruno Langa é o próximo a ficar frente-a-frente com Efigénio Baptista, a partir desta quinta-feira para deixar a sua versão no tribunal.

Em termos de tipos legais de crimes, Bruno Evans Tandane Langa é acusado de chantagem, falsificação de documentos e uso de documentos falsos, abuso de confiança, posse de armas proibidas, associação para delinquir, corrupção passiva e branqueamento de capitais.

Com os 8.5 milhões de dólares obtidos ilegalmente, Bruno terá feito a construção e compra de imóveis, apartamentos, mais de 840 cabeças de gado bovino, tractores, máquina escavadora e outras viaturas, além de viagens.

Os advogados de Defesa solicitaram ao Tribunal, esta terça-feira, durante o julgamento do “caso dívidas ocultas”, a decorrer na Cadeia de Máxima Segurança da Machava, província de Maputo, a audição de Jean Boustani. Segundo entende a Defesa, o cidadão libanês é importante para clarificar várias questões ligadas ao processo.

Depois de ouvir as partes envolvidas, a Defesa e o Ministério Público, o Juiz Efigénio Baptista não se opôs à proposta apresentada, pelo que Jean Boustani poderá ser ouvido na qualidade de declarante, através de videoconferência. No entanto, a Ordem dos Advogados de Moçambique defendeu que o cidadão franco-libanês deve ser ouvido no Tribunal presencialmente. Para que tal acontecesse, a Procuradora Ana Sheila Marrengula lembrou que os procedimentos legais, que devem ser seguidos para a audição de Jean Boustani, a envolverem dois Estados, são, em princípio morosos, daí haver o risco de o julgamento encerrar antes de se obter qualquer resposta em relação à possibilidade da audição solicitada pela Defesa ao Tribunal.

O Juiz Efigénio Baptista acrescentou que, se não for possível ouvir Jean Boustani, nos próximos três meses, poder-se-ão seguir outros procedimentos legais.

Antes de encerrar o tema “Jean Boustani”, Efigénio Baptista citou o que o cidadão libanês disse às autoridades americanas que não usou o sistema financeiro norte-americano para branquear capitais. Segundo o Juiz, num outro julgamento, Boustani reconheceu ter corrompido os moçambicanos.

Ainda esta terça-feira, Armando Ndambi Guebuza foi ouvido pelos advogados de Defesa. Durante as questões a si colocadas, o réu disse que nunca ouviu falar de Ângela Leão, que não a conhece, nem o antigo director do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), Gregório Leão. Segundo o réu, em resposta às perguntas colocadas pela Defesa, nas suas viagens aos Emirados Árabes Unidos, nunca foi pronunciado o nome “Ângela Leão”.

De seguida, os advogados de Defesa perguntaram ao filho do antigo Presidente da República (Armando Guebuza), se teria falado com o antigo ministro da Defesa (Filipe Nyusi) sobre documentos que deviam ser apresentados ao pai à data dos factos. A resposta foi não. E mais, Armando Ndambi Guebuza disse que nunca esteve com Cipriano Mutota, pois, à data dos factos, nem o conhecia. O réu também afirmou que não conhece as empresas MAM, Proindicus e EMATUM e que nunca participou em reuniões de Comando Conjunto, Comando Operativo, Conselho de Ministros, no Ministério da Defesa e nas Finanças.

A sétima sessão do julgamento do “caso dívidas ocultas” foi a mais curta até agora. Conforme a solicitação da Defesa, feita semana passada, o Juiz Efigénio Baptista decidiu reservar esta quarta-feira para folga. Assim, as audiências retomam à Cadeia de Máxima Segurança da Mahava quinta-feira, com audição ao réu Bruno Langa.

O sétimo dia da sessão de julgamento arrancou por volta das 09h50, com questões da Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), na qualidade de Assistente do julgamento, colocadas ao réu Ndambi Guebuza.

Na sua introdução, a Ordem dos Advogados de Moçambique colocou perguntas cujo conteúdo chamou de “estranhas coincidências” e Ndambi Guebuza disse, repetidas vezes, que já respondeu ontem às questões que está a ser colocado, por isso reiterava que “não vou responder, já respondi ontem”.

Entre as várias questões sobre as “estranhas coincidências”, a OAM perguntou se Ndambi Guebuza não acha estranho que Iskandar Safa, dono da Privinvest, tenha recebido a si, Teófilo Nhangumele e Bruno Langa em simultâneo, quando estiveram em Abu Dhabi, tendo Ndambi reiterado que “a questão é repetitiva, não vou responder. Já respondi ontem”.

Reagindo sobre uma outra questão, Ndambi Guebuza disse que quem fazia parte do Comando Operativo e do Comando Conjunto eram o ministro da Defesa e outros membros e, por isso, são eles que deviam responder às perguntas, que, a ver do réu, são redundantes a si, pelo facto de já ter dado as respectivas respostas no seu primeiro dia de audição.

O mandatário da Ordem dos Advogados de Moçambique explicou que alguns dos membros do Comando Conjunto na altura já foram arrolados como declarantes do processo, e que os demais poderão ser convocados em função da solicitação dos advogados do réu.

Em jeito de protesto, o advogado de Ndambi Guebuza, Isálcio Mahanjane, disse que as questões da OAM estão a ser sugestivas e visam influenciar o réu a dar determinadas respostas.

DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS À AUTORIDADE TRIBUTÁRIA GERA DEBATE NO TRIBUNAL

No decurso do interrogatório esta manhã, a Ordem dos Advogados questionou se Ndambi Guebuza declarou os bens à Autoridade Tributária de Moçambique, ao que o réu disse que preferia não responder à questão. A pergunta em alusão e a reacção do réu geraram um longo e intenso debate, que levou o advogado de Defesa do réu e o Juiz Efigénio Baptista a recorrerem ao que postula a Lei sobre a declaração de rendimentos.

Por sua vez, Efigénio Baptista disse que, de acordo com a Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais, os bens devem ser declarados, independentemente de não estarem em território nacional.

Outrossim, o Ministério Público pronunciou-se positivamente sobre a necessidade de declaração de bens, mesmo que estejam fora do país, à Autoridade Tributária de Moçambique.

Questionado sobre a aplicação do valor recebido, fruto de parcerias com Jean Boustani, Ndambi Guebuza apenas disse que já viveu por muito tempo na África do Sul.

“Eu tenho um historial de vivência na África do Sul. Fiz faculdade lá. Depois de terminar os estudos, fiz parcerias lá, na África do Sul. Vivi lá por mais de 20 anos”, disse Ndambi Guebuza

Questionado sobre os eventuais prejuízos que a contratação das dívidas está a causar ao Estado, Ndambi Guebuza remeteu a responsabilidade de dar a resposta ao então Chefe do Comando Conjunto, ministro da Defesa, cargo que, na altura, era ocupado por Filipe Nyusi, actual Presidente da República.

No processo que está em julgamento desde o passado dia 23 de Agosto, Armando Ndambi Guebuza é acusado de crimes de falsificação de documentos, corrupção passiva, abuso de confiança e associação para delinquir.

Armando Ndambi Guebuza disse ao Tribunal, ontem, segunda-feira, que não recebeu brochuras do amigo Bruno Langa, referentes ao projecto de Protecção da Zona Económica Exclusiva, e que não fez chegar qualquer documento por si entregue ao seu pai, quando era Presidente da República. Segundo o réu, o Ministério Público é mentiroso e a Procuradoria-Geral da República é a máquina utilizada para perseguir a sua família.

A segunda semana do julgamento do caso das dívidas ocultas arrancou com audiência a Armando Ndambi Guebuza. Na tarde desta segunda-feira, o réu respondeu, como é óbvio, a várias perguntas colocadas pelo juiz Efigénio Baptista e pela Procuradora Ana Sheila Marrengula. Durante o seu depoimento, Armando Ndambi Guebuza afirmou que não fez solicitação de cobrança, nem fez chegar documentos entregues por Bruno Langa, sobre o projecto de Protecção da Zona Económica Exclusiva, ao seu pai, na altura Presidente da República. Segundo sustentou, o Presidente da República tem canais próprios, quando se trata de receber documentos, e não é o filho que cumpre essa função.

Confrontado pela Procuradora Ana Sheila Marrengula, Armando Ndambi Guebuza disse que o Ministério Público é mentiroso e que a Procuradoria-Geral da República persegue a sua família. “A PGR foi a máquina usada para me perseguir”. Continuou: “A PGR sempre inventou desculpas para me manter preso”. Dito isto, o réu reforçou que a sua prisão foi utilizada como perseguição política, para chantagear o pai: Armando Emílio Guebuza.

Entre advertências do Ministério Público em relação a uma eventual falta de respeito por parte do réu e protestos da Defesa, Ndambi Guebuza respondeu que, em 2012, viajou a Abu Dhabi à procura de oportunidades de negócio. No entanto, não sabe dizer com que propósito o amigo Bruno Langa e Teófilo Nhangumele viajaram. O réu confirmou a sua parceria com Jean Boustani, a título individual e não em representação do grupo Previnvest. Ainda assim, não quis falar dessa parceria. Ndambi Guebuza recusou que tenha viajado para receber qualquer adiantamento conforme a acusação do Ministério Público. E mais, confirmou que é amigo de Bruno Langa, mas recusou que tenha relação com António Carlos do Rosário.

Em audiência, Armando Ndambi Guebuza confirmou ainda que, em 2011, viajou à Alemanha apenas com Bruno Langa, e não com António Carlos do Rosário e Teófilo Nhangumele, segundo a acusação.

Sobre as informações pormenorizadas em relação às viagens realizadas à Alemanha ou Abu Dhabi, o réu respondeu que toda e qualquer viagem dos filhos do Presidente da República de Moçambique segue um protocolo, daí ignorar muitas questões pontuais a si colocadas.

Ndambi Guebuza confirmou que possui uma conta bancária em Abu Dhabi. Quando confrontado pela Procuradora Ana Sheila Marrengula, por ter dado uma resposta diferente à PGR, o réu sublinhou que a pergunta não foi feita da mesma maneira como o juiz Efigénio Baptista fez. Ou seja, na PGR, Ndambi disse que, há dois anos, a PGR quis saber se teria aberto uma conta bancária, em Abu Dhabi, para receber dinheiro de subornos, pelo que disse não.

Armando Ndambi Guebuza é acusado de crimes de falsificação de documentos, corrupção passiva, abuso de confiança e associação para delinquir.

SOBRE RECEBIMENTO DE DINHEIRO

Na audiência desta segunda-feira, na Cadeia de Máxima Segurança da Machava, província de Maputo, Armando Ndambi Guebuza negou ter recebido dinheiro das dívidas ocultas. Entretanto, confrontado com comprovativos de transferência de valores, o réu alegou que a Privinvest lhe pagou dinheiro no âmbito de parcerias com Jean Boustani, em outros negócios.

Ao longo de aproximadamente 10 horas de audiência, o Juiz Efigénio Baptista citou mensagens enviadas ao correio-electrónico de Armando Ndambi Guebuza, mas o filho do antigo Presidente da República recusou a recepção. E não só, Ndambi Guebuza também negou que recebeu a quantia de 14 milhões de dólares, que conhece Batsetsane Thlokoane e esclareceu que não tem conta bancária no Líbano. Mesmo confrontado com documentos por si assinados, Armando Ndambi Guebuza disse que são falsos, reiterando que não recebeu qualquer valor e que, hoje em dia, se podem falsificar assinaturas.

Embora os dados da empresa Privinvest apontem Armando Ndambi Guebuza como trabalhador, inclusive no documento exibido pelo Juiz da causa,  vem que é mecânico hidráulico, o réu nega ter trabalhado para a empresa em alusão. No entanto, fazia viagens pagas pela empresa Privinvest, segundo disse, na qualidade de parceiro. O réu disse que não há problema nenhum nisso, que a Privinvest tem custeado despesas de viagens aos seus parceiros.

Quando, a certa altura da audiência, a Procuradora Ana Sheila Marrengula disse que Armando Ndambi Guebuza estava a faltar com a verdade, o réu e o seu advogado Isálcio Mahanjane protestaram. Mahanjane ainda disse que a Procuradora estava a colocar perguntas sugestivas e Ndambi Guebuza rematou que o Ministério Público é mentiroso, que desde a sua prisão tem agido com parcialidade. Inclusive, afirmou que o Ministério Público “vazou” informação publicada na imprensa, denegrindo a sua imagem sem respeitar a presunção de inocência.

A sessão desta segunda-feira, entre o réu Armando Ndambi Guebuza e a Procuradora Ana Sheila Marrengula foi tensa. Por isso, várias vezes, a Procuradora deu “ponto de ordem”, exigindo respeito do réu, porque está a exercer uma função em representação do Estado moçambicano. A Procuradora Ana Sheila Marrengula impediu o réu de colocar perguntas, pois, na qualidade de réu, a sua função é responder às questões em tribunal e não colocar. O Juiz Efigénio Baptista acalmou as emoções, mas Ndambi Guebuza também manifestou que se sentia desrespeitado pelo Ministério Público, no caso, na pessoa da Procuradora Ana Sheila Marrengula.

A sexta sessão do julgamento do caso das dívidas ocultas contou com a presença do antigo Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, que não falou à imprensa. No tribunal montado na Cadeia de Máxima Segurança da Machava, a audiência iniciou por volta das 10 horas, portanto, com uma hora de atraso, e prolongou-se até depois das 20 horas. Esta terça-feira, os trabalhos prosseguem a partir das 9 horas, com a presença de Armando Ndambi Guebuza no tribunal.

Na audição que iniciou com um hora de atraso, o réu Ndambi Guebuza começou por recordar como acabou por ser detido, após ser ouvido pela Procuradoria-Geral da República, em 2019.

“Eu fui chamado para a Procuradoria quando estava a caminho de Bilene e, quando cheguei lá, o Procurador Délio Portugal disse que eu era perigoso demais para continuar na via pública”, recordou.

Ao Tribunal Ndambi Guebuza disse que não esteve envolvido na concepção do projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva, entretanto o Juiz Efigénio Baptista confrontou-o com e-mails teria trocado com António Carlos do Rosário e Teófilo Nhangumele sobre alteração do valor do projecto. Ainda assim, a resposta do réu continuou a ser “não estive envolvido e não confirmo a recepção dos e-mails”, disse.

Relativamente ao endereço “aguebuza@gmail.com”, o réu confirmou que é seu, mas não confirma a recepção de nenhum e-mail sobre as possíveis negociações.

Sobre as viagens, Ndambi Guebuza disse que só viajou com Bruno Langa, que é o seu amigo.

“Eu fui à Alemanha, porque tinha outros negócios lá, não estive com Carlos Do Rosário, nem com Teófilo. Eu estava noutra missão”.

Questionado sobre quem custeou a viagem, o réu, que é filho do antigo Chefe do Estado, respondeu: “Quem sempre tratou das minhas viagens é o protocolo da Presidência. Eu só tinha que avisar com antecedência que ia viajar. Não me lembro de onde fiquei hospedado”.

Ndambi Guebuza confirma que esteve em Abu Dhabi, nos escritórios da Privinvest em busca de oportunidades de negócio, mas não na companhia de Teófilo Nhangumele nem de Carlos Do Rosário.

Ainda a responder às questões do Juiz, Ndambi Guebuza disse que conheceu Teófilo Nhangumele agora que estão detidos no mesmo estabelecimento penitenciário: “talvez eu já o tivesse visto, mas já não me recordo dele”.

O réu Ndambi Guebuza, que continua a ser ouvido, não confirma que tenha custeado as viagens para Abu Dhabi e nega ter trabalhado para Privinvest. Apenas diz ter recebido um documento para tratar visto de residência em Abu Dhabi, onde refere que era mecânico hidráulico, o que, a seu ver, não é ilegal.

“Eu não tratei os documentos, eles é que trataram. Mas eu sei que não é ilegal, porque, se fosse ilegal, eu não teria conseguido viajar para lá.”

Ndambi Guebuza confirmou, ainda, que tem uma conta bancária em Abu Dhabi, que foi aberta por Jean Boustani.

O Juiz Efigénio Baptista fez a leitura dos extractos bancários de Ndambi Guebuza, que constam da acusação do Ministério Público, em que se mencionam a compra de casas, carros, pagamento de viagens e transferências de valores para outras contas.

O réu, que disse que não queria falar sobre o assunto supracitado, confirmou a recepção de valores monetários nas suas contas, em bancos da África do Sul, “resultantes de outras parcerias que tinha com Jean Boustani, que não posso revelar aqui”, referiu.

Ndambi Guebuza usou a audição para fazer um desabafo de que o Ministério Público não foi sério com o processo, por o ter prendido, não obstante a sua inocência, segundo alega, e deixa um desafio para que se prove o seu envolvimento.

“O Ministério Público não foi sério com este processo. Eu sou inocente até que se prove o contrário. Mas, eu fui considerado criminoso após ser preso. Eu fui exposto a nível internacional. Não estou a dizer que alguém é culpado, só estou a falar da forma como a PGR agiu, estou a aproveitar este momento para desabafar sobre este assunto que já me persegue há três anos”, expressou Ndambi Guebuza.

O antigo Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, está hoje presente no tribunal, onde decorre a audição do filho, Armando Ndambi Guebuza, acusado de quatro crimes, no polémico caso das dívidas ocultas, nomeadamente, associação para delinquir, abuso de confiança, falsificação de documentos e corrupção passiva.

O arranque da sessão está atrasado a cerca de uma hora, pois devia ter arrancado às 10 horas, faltando apenas a presença do Juiz e do Ministério Público na tenda que acolhe o julgamento.

O advogado de defesa de Ndambi Guebuza, Alexandre Chivale, informou, mesmo antes do arranque da sessão, que o réu a ser ouvido hoje não está bem de saúde, não especificando, porém, de que doença padece Ndambi Guebuza.

“Ele sentiu-se mal, e a médica foi chamada. Ele já medicou, e penso que está em condições de avançar. Vamos lá ver no que vai dar”, disse Chivale, tendo destacado que se sente tranquilo para a audição do seu constituinte.

Arranca, hoje, a segunda semana da sessão de audiência e discussão do julgamento do caso “dívidas ocultas” e Armando Ndambi Guebuza, filho do antigo Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, é que estará frente-a-frente com o juiz Efigénio Baptista, para contar a sua versão dos factos sobre o calote que lesou o Estado em cerca de 2.2 mil milhões de dólares. Mesmo com algumas tendas deitadas abaixo por forte vento que se fez sentir no sábado, na cidade e província de Maputo, a sessão decorrerá sem sobressaltos.

É, sem dúvidas, uma das pessoas mais esperada no banco dos réus do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, para explicar o seu envolvimento no projecto que endividou e causou uma crise de dívida pública sem precedentes ao Estado moçambicano, cujas implicações prevalecem até hoje.

Chama-se Armando Ndambi Guebuza, filho do antigo Presidente da República (Armando Emílio Guebuza), figura que é tida como quem levou o projecto até ao pai, tendo recebido em troca cerca de USD 33 milhões. 

Ndambi Guebuza, ou simplesmente Júnior, conforme citaram em alguns momentos, os dois primeiros réus ouvidos pelo Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, segue Teófilo Nhangumele e Cipriano Mutota, nas audições e marca o arranque da “(in)tensa” segunda semana de julgamento.

A audição a Ndambi acontece após ventos fortes que se fizeram sentir na província de Maputo terem afectado três tendas ligadas ao julgamento, tendo duas delas sido derrubadas.

Mesmo com esta situação, o julgamento do maior escândalo financeiro do país vai continuar, até porque as tendas afectadas são da imprensa, de espera dos réus e da segurança, tendo as duas últimas sido deitadas abaixo.

A tenda principal, que acolhe a sessão de audiência e discussão do julgamento, está intacta enquanto decorrem os trabalhos para a reposição das que foram atingidas pela ventania, conforme constatou “O País”, no terreno.

Em comunicado de imprensa a que tivemos acesso, o Tribunal Supremo (TS) assegurou que este incidente não afectará o decurso normal da sessão do julgamento do Processo 18/2019-C que decorre nas instalações do Estabelecimento Penitenciário de Máxima Segurança, mais conhecido como B.O.  

“Leva-se ao conhecimento dos Órgãos de Comunicação Social, para a necessária divulgação pública, que os ventos fortes que assolaram a Cidade e província de Maputo, desde o final da tarde de ontem, dia 28 de Agosto de 2021, afectaram duas tendas anexas à tenda principal que acolhe a sessão de audiência e discussão de julgamento do Processo de Querela nº 18/2019-C, que decorre nas instalações do Estabelecimento Penitenciário Especial de Máxima Segurança – BO. A tenda principal não foi afectada. Realizados e concluídos os trabalhos de reposição dos danos causados, tudo está assegurado para o normal decurso da sessão, a partir de amanhã, segunda-feira, dia 30 de Agosto, pelas 10 horas”, lê-se no comunicado de imprensa do TS.

Até ao final da tarde de ontem, os trabalhos para a reposição das tendas danificadas estavam bem adiantados.

OS CRIMES DE QUE É ACUSADO NDAMBI GUEBUZA

Gestor de empresas, de 44 anos de idade, Armando Ndambi Guebuza foi contactado por Bruno Langa. Ndambi concordou em fazer chegar o projecto ao pai, mas cobrou dinheiro. Também esteve presente nas viagens à França e Abu Dhabi ao lado de oficiais do SISE, depois da aprovação do projecto. Pelo trabalho, Ndambi recebeu pelo seu papel USD 33 milhões. Segundo o Ministério Público, Ndambi cometeu crimes de chantagem (4 crimes), falsificação de documentos, uso de documento falso, abuso de confiança, corrupção passiva para acto ilícito, associação para delinquir e branqueamento de capitais.

Em resposta às questões de um dos advogados da Defesa de Ndambi Guebuza, Teófilo Nhangumele disse que o sistema, que queriam desenvolver, ajudaria a combater o terrorismo em Cabo Delgado.

“Com o sistema de monitoria e vigilância que foi projectado por mim e pelo Cipriano Mutota, eu acredito que podia ajudar a combater o terrorismo em Cabo Delgado de maneira significativa. Sei que há dificuldades para dizer se é insurgência ou terrorismo. Mas, pelo menos íamos conseguir dar algum contributo para combater o fenómeno”, disse.

O Juiz Efigénio Bapstista questionou ao réu se acha que combateria o terrorismo em Cabo Delgado com 622 milhões de dólares, ao que Teófilo reagiu: “não me sinto confortável para responder a essa questão”.

Ainda no seguimento do interrogatório de Alexandre Chivale, Teófilo Nhangumele reiterou que quem pediu ao Presidente da República que o projecto avançasse foi o então ministro da Defesa e que não sabe quem achou que Ndambi Guebuza era merecedor do recebimento de dinheiro.

Teófilo Nhangumele disse, igualmente, a Alexandre Chivale que não conhece Inês Moiane e que nunca falou com Armando Emílio Guebuza.

Ainda na audição de hoje, Teófilo Nhangumele falou do seu percurso profissional, tendo dito que é formado em Gestão de Negócios, tem uma experiência de 30 anos na área e passou por várias empresas, destacando que foi funcionário da embaixada britânica e director da Câmara de Comércio Moçambique-África do Sul.

Teófilo Nhangumele assegurou, igualmente, que já tinha elaborado outros projectos da mesma dimensão que o da Zona Económica Exclusiva.

“Sente alguma obrigação de devolver o dinheiro que recebeu ao Estado moçambicano?”, a questão de João Nhampossa, membro da Ordem dos Advogados, era clara e a resposta (no caso, pergunta retórica) também foi: “Por que?”. O réu Teófilo Nhangumele denotava não ver nenhuma razão para devolver ao Estado moçambicano o valor de 8.5 milhões de dólares, até porque defende: “tudo que ganhei foi fruto do meu trabalho”.

O réu, que é ouvido já há três dias, diz não ter consciência de ter causado danos ao Estado moçambicano, até porque “nem vejo esse dano”.

Filipe Sitoe, também representante da Ordem dos Advogados de Moçambique, entidade que está no julgamento do caso das dívidas ocultas na qualidade de assistente, foi o primeiro a colocar questões ao réu.

Nhangumele referiu, repetidamente, que era apenas facilitador no processo de concepção da empresa Privinvest. Mais ainda, diz que, na viagem à Alemanha, não sabia que estava a substituir Cipriano Mutota, contrariando a informação dada por Mutota (também réu), segundo a qual foi substituído por Nhangumele, visto que perdera a sua irmã.

Nhangumele diz, também, que, da reserva da designação ProIndicus (empresa estatal), constava o seu nome, igualmente na qualidade de facilitador, sem ter nenhum compromisso contratual com o Estado moçambicano.

Quanto à responsabilidade de ser facilitador, diz que lhe foi atribuída pelas partes envolvidas no negócio, neste caso o Governo e a empresa Privinvest.

Para receber os 8.5 milhões de dólares dados pela Privinvest, Teófilo Nhangumele fechara um contrato com a empresa. Na negociação, deveria receber 10 milhões de dólares, mas, do contrato, sempre constaram 8.5 milhões.

O réu nega ter-se reunido com Isaltina Lucas (então funcionária do Ministério da Economia e Finanças), para tratar questões financeiras do projecto, segundo havia dito o seu amigo Mutota.

Revela, igualmente, que, do valor que recebeu junto a Bruno Langa e Armando Ndambi Guebuza, não havia nenhuma obrigatoriedade de dividir com os membros do Serviço de Informação e Segurança do Estado, mas pelo papel destes, sentiam que era preciso gratificá-los, razão pela qual ficou bastante triste por não ter partilhado o valor com Cipriano Mutota, oficial do SISE.

A Defesa entende, entretanto, que a Ordem dos Advogados e o Juiz da causa estão a ignorar a presunção de inocência, a avaliar pela forma com que são colocadas as questões.

DESPACHO DE PRONÚNCIA DEVIA TER MAIS NOMES ARROLADOS, DIZ NHANGUMELE

Ouvido pela Defesa, o réu Teófilo Nhangumele diz que nunca se constituiu, que saiba, um grupo com intenções de lesar o Estado, entretanto explica que, das reuniões em que esteve, participavam outras pessoas que deviam ser chamadas ao julgamento, porém não estão no processo. Mas, o réu não diz quais são os nomes.

“Há reuniões onde eu estive em que havia outras pessoas que deviam estar no despacho”, disse, para de seguida acrescentar que “dizer que houve um grupo que tinha objectivos de lesar o Estado é inglório”.

Teófilo Nhangumele defende que, à semelhança do projecto de protecção da Zona Económica Especial que levou à criação da ProIndicus, todos os projectos são susceptíveis a falhar e “o que devia acontecer é corrigir-se o projecto”.

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