Na posse de todas aquelas informações o senhor Mapilele ficou estático. Meditava.
Aquela comitiva da comunidade ia retirar-se para deixar com ele a responsabilidade de prosseguir os trâmites para a consumação do enterro da falecida esposa.
“Lavo das mãos toda a responsabilidade de tratar seja o que for para o enterro dela”, disse o senhor Mapilekle, fleumático, quase com um sorriso trocista nos lábios.
“Não está a falara sério, irmão Mapilele. A irmã Veva continua sua esposa, apesar do sucedido”, aventou o emissário-mor de sobrolho carregado. Outros remexeram-se desconfortados sobre os assentos. Estava nos horizontes que o problema estava a crescer, a tomar proporções que ninguém previra.
Trocaram olhares de estupefação e mantiveram-se em silêncio.
E Mapilele atacou, já com ferocidade:
“Meus caros, fizeram bem em vir à minha morada anunciar esta triste notícia. Triste para ela, a Veva, para a família dela e para comunidade. Assim ficamos todos a saber quem era ela na verdade, que tipo de esposa eu tinha nesta casa. Morreu na cama doutro homem? Tudo muito bem. Esse tal do Bocoda que assuma toda a rsponsabilidade por aquilo que aconteceu. Comigo não contem, seja para o que for. Não quero ajuntamentos em minha casa, nem mensagens de condolências de ninguém. Ainda querem-me ferir mais? Chega! E ponto final meus senhores”.
“Irmão Mapilele”, outra voz que não a do emissário-chefe fez-se ouvir, mais cordata e conciliadora. “Para todos os efeitos, e segundo a catecismo da Igreja Católica, a falecida tornou-se sua esposa pelo matrimónio, e por isso recomenda unidade na vida e na morte”.
“ Na vida sim, mas enganado, como todos podem constatar. Na morte não, porque não morreu em minha casa, muito menos na minha cama. A tal doutrina cristã de que você está a falar o que diz sobre o adultério? Estão calados? Se eu fosse outra pessoa até iria ao funeral sim, mas para apedrejar o cadáver dela, estão a perceber?”.
Mapilele levantou-se de brusco da cadeira e convidou os membros da delegação a abandonarem a sua propriedade.
“ Meus senhores, renovo os meus agradecimentos pela notícia, mas façam o que lhes convier porque apartir deste momento já lavei as mãos a tudo o que diga respeito à pessoa e ao corpo da Genoveva. Deus castiga os que erram. Ela pecou então que se amanhem, ela, o amante e a família dela”.
O escândalo encheu as bocas de comentários. Especulações choviam de todos os cantos.
O fim trágico da dona Genoveva ficou marcado de muitos questionamentos nas cabeças de muitos homens sobre quantas esposas tinham conduta semelhante à que levou à perda de vida da vizinha.
E, deste modo, a Veva do Mapilele teve aquele funeral insólito, o fim triste de desmerecer as glórias e as homenagens do esposo legítimo, dos vizinhos, familiares e amigos, que a tinham por mulher exemplar, fiel aos cânones do matrimónio.
Quatro coveiros samaritanos juntaram as vozes à do infeliz amante, oraram e entoaram despedidas à senhora Genoveva Mapilele: ”…pai-nosso que estais no Céu…o pão nosso de cada dia nos dai hoje… perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos a quem nos tem ofendido e livrai-nos do mal…amen…”.
Umas pàzadas vigorosas dos diligentes coveiros deram forma à campa e “…era uma vez uma senhora de nome Veva…”.
Deste modo nasceu aquela lenda muito popular da mulher que, por via de amantismos, pereceu na esteira do amante.
O Djacabai era uma sombra de si próprio, um homem desolado, atarantado pela monumental desgraça que em si caira, e pela possibilidade agravante de poder vir a ser preso, acusado de homicídio e desterrado para a ilha de São Tomé… o que de facto veio a suceder.
in Caderno de Memórias, Volume II.