O País – A verdade como notícia

O escritor Adelino Albano Luís venceu, esta quinta-feira, a segunda edição do Prémio Literário Mia Couto, com o livro Estórias trazidas pela ventania (prosa). A iniciativa é da Associação Kulemba em parceria com a Cornelder de Moçambique.

Macossa é um distrito como tantos outros do país. O lugar recôndito não tem electricidade e nem água canalizada. Só da vila-sede para a cidade de Chimoio, são umas boas cincos horas de carro. Afinal, a estrada é péssima e os 200 quilómetros de distância são uma infinidade de circunstâncias difíceis para quem almeja chegar rápido e seguro ao destino.

Na Escola Básica de Nhamagua, em Macossa, trabalha um professor de Português, que, há um ano e meio, tem leccionado as 7ª, 8ª e 9ª classes. Chama-se Adelino Albano Luís, e, segundo ficou a saber esta noite, é o grande vencedor da segunda edição do Prémio Literário Mia Couto, no género prosa. Quando lhe foi dada a informação, depois das 23h30, encontrava-se na cama, a tentar sonhar um capítulo para o dia seguinte. Por isso, longe de pensar o que pretendia a pessoa que lhe ligou, mal soube da razão, suspirou com espanto: “Meu Deus!”.

Contendo a emoção, naquele mesmo lugar agreste, o escritor de 26 anos de idade explicou que vencer o Prémio Literário Mia Couto significa que deve continuar a escrever e a melhorar cada vez mais a sua prosa, os seus contos. De seguida, entre sorrisos e silêncios repentinos, confessou: “Não contava que ganharia o prémio. Quando a lista com os nomes dos ilustres escritores finalistas foi anunciada, conclui que não tinha qualquer chance. Esta notícia é, para mim, uma enorme surpresa”.

Estórias trazidas pela ventania é um livro escrito em um ano, entre os finais de 2021 e os finais de 2022. Adelino Albano Luís lançou-se ao projecto logo depois de ter terminado o seu primeiro livro, Cronicontos da cabeça de velho.

Estórias trazidas pela ventania é um livro que, ao longo do tempo, foi ganhando novas páginas e narrativas até à versão final, que permitiu ao autor conquistar mais um prémio literário. “Espero que este prémio contribua para minha afirmação enquanto escritor e atraia mais leitores e curiosos, para que saibam o que escrevo a ponto de vencer um prémio tão distinto quanto este”.

À pergunta que tipo de responsabilidade a distinção pode trazer, Adelino Albano Luís respondeu: “A única responsabilidade é o maior compromisso para comigo mesmo. O meu pai disse-me, quando fui anunciado como finalista, que, se eu levava a escrita nas brincadeiras, a partir daquele momento, devia levá-la a sério”.

Tal como o pai, quem também lê o escritor de Macossa é a irmã mais nova, Saquina Albano Luís. É também por ela e pelos alunos de Nhamagua que o contista escreve. “Espero que este prémio sirva de incentivo para os meus alunos daqui de Macossa, um lugar que está a ser uma rica fonte de inspiração e de novas histórias”.

Estórias trazidas pela ventania, conforme a acta do júri, constituído por Lourenço do Rosário (presidente), Teresa Manjate, Ondjaki, Marcelo Panguana e Tânia Macedo, distinguiu-se “pela riqueza temática, versatilidade linguística e uma consistente construção dos contos”. Assim, reconhecido o seu livro, as ventanias de Agosto levam a casa de Adelino Albano Luís 400 mil meticais, valor fornecido pela empresa Cornelder de Moçambique, que, em parceria com a Associação Kulemba, organiza o prémio.

Ao género poesia, nesta segunda edição do Prémio Literário Mia Couto, o júri decidiu não atribuir nenhum vencedor.

Sobre o premiado

Adelino Albano Luís nasceu em 1998, na Cidade de Chimoio. É licenciado em Filosofia pela Universidade Eduardo Mondlane. É autor da obra Cronicontos da Cabeça do Velho (2022), prémio literário Calane da Silva, organizado pela Alcance Editores (4ª edição- 2021). Também conquistou o primeiro lugar do Concurso de Crónicas da primeira edição da Feira de Livros da Beira (2021).

Na próxima terça-feira, a partir das 18 horas, Filipe Branquinho vai inaugurar, na Sala de Exposições do Centro Cultural Franco-Moçambicano, na Cidade de Maputo, a individual “A pente fino”.

De acordo com o comunicado de imprensa do Centro Cultural Franco-Moçambicano, a exposição de Filipe Branquinho apresenta duas séries. Primeiro, B(L)ACK, uma homenagem ao cabelo natural crespo, apresentada como postais de memórias.

A série, informa o comunicado de imprensa do Centro Cultural Franco-Moçambicano, elogia os dreads e as tranças intricadas que simbolizam o pertencimento à comunidade e contam histórias sem precisar de palavras.

Filipe Branquinho utiliza os seus desenhos para transformar esses penteados em símbolos carregados de significados culturais e históricos.

Segunda série, IN GOLD WE TRUST, que oferece uma crítica incisiva à ganância e corrupção que permeiam certos segmentos da sociedade.

“Branquinho utiliza a cédula do dólar como elemento central nos seus desenhos para explorar como o capital domina e molda a nossa realidade. As obras revelam como o dinheiro transforma o quotidiano num espectáculo de consumo e alienação, com figuras que se tornam quase intangíveis, reflectindo uma sociedade onde o prestígio e a aparência são mais valorizados do que o valor substancial”, lê-se na nota de imprensa do Centro Cultural Franco-Moçambicano.

Por: Gilberto Matusse

Em meados da década de 1980, Aldino Muianga, um dos mais proeminentes membros do grupo da Charrua, a revista que deu voz e visibilidade a uma geração de jovens escritores de então, muitos deles, hoje, escritores renomados, assinava os seus contos como Khambira Khambiray.

A história do pseudónimo, contada pelo próprio autor, começa com a sua primeira colocação como prático, em 1978, no Hospital Provincial de Chimoio. Numa das suas viagens a um campo de refugiados e combatentes da luta de libertação do Zimbabwe, conheceu um paciente, um guerrilheiro, que sofria de uma infecção pulmonar grave. Tendo levado esse paciente do campo para o Hospital Provincial, acabou estabelecendo com ele uma relação de amizade muito particular. Numa certa ocasião, o paciente, que mostrava muita curiosidade pelos livros e apontamentos do seu médico, teria dito o seguinte: “Se eu soubesse ler e escrever, encheria livros com muitas histórias”. Em resposta, o médico prometeu: “Se eu escrever um livro, um dia, usarei o teu nome”. Khambira Khambiray era o nome de guerra do jovem guerrilheiro. E Aldino honrou a promessa, ao assinar com o nome do seu paciente o seu primeiro conto publicado, “A Vingança de Macandza”.

Vem esta história a propósito da dupla condição de Aldino Muianga, a de “clinicador” e a de contador de histórias, a que ele próprio refere como as “carreiras médica e de escritor”. Nada mais ilustrativo desta condição do que este livro que agora sai: Hospital (Contar Clinicando).

O livro é composto por 15 narrativas autónomas, em que o laço que as conecta é o hospital – a instituição, não um certo estabelecimento hospitalar – e os procedimentos clínicos que lá ocorrem. Diz-se aqui instituição porque, de facto, contam-se eventos que se deram em diferentes hospitais, em diferentes locais de dois países: Moçambique e Zimbabwe. Nas narrativas, relatam-se episódios “reais, vividos como o foram no quotidiano”, ora acontecidos com o próprio autor, ora acontecidos com outros clínicos. São experiências extremas – e, de outro modo, não seriam dignas de ser contadas –, que desafiam em grande medida os limites da nossa imaginação e levantam dúvidas sobre a sua factualidade. Não fosse a garantia acima expressa nas palavras do autor, o leitor comum julgá-las-ia ficcionais. Por essa via, diz ainda o autor, na sua nota introdutória, contá-las visa “franquear a porta de acesso ao universo mítico da profissão médica, aos desafios de cada momento, aos dilemas e dúvidas nas decisões, às frustrações, à angústia diante da impotência de corresponder às expectativas de salvar vidas e de mitigar o sofrimento dos enfermos.” Mas, na verdade, pela porta deste livro, acede-se a bem mais.

É no espírito deste desígnio que desfilam narrativas como a que abre o livro, “Eutanásia”, título irónico para um relato em que a dedicação, a entrega, o zelo dos profissionais, acabam por se transformar numa “hipercorrecção”, resultando num incidente em que se escreve torto por linhas direitas. De resto, o livro povoa-se destes incidentes, em que alguma distracção, algum erro, algum procedimento menos adequado, alguma inexperiência, desagua num desfecho trágico. E, neste ponto, é preciso dizê-lo, Hospital (Contar Clinicando) não traz histórias com finais felizes. Estes, só em alucinação, como a da Elsa Venância, a jovem que “tinha apenas dezanove anos de idade, uma cabeça cheia de projectos e sonhos de ser uma distinta magistrada, esposa e mãe de muitos filhos”, que, à hora da morte, “via a imagem do seu pai a segurá-la pela mão, escoltá-la ao altar para ofertá-la em matrimónio ao noivo, o senhor Ricardo Quelhas”. Hospital (Contar Clinicando) pinta uma realidade cruel, trágica, com finais, no geral, marcados por mortes e amputações de membros e de sonhos.

Se a realidade é cruel para os pacientes, não o é menos para os clínicos, frustrados e angustiados com a sua impotência ou enfrentando dilemas como o do Dr. Andrew Nomitenda, incapaz de decidir se extrai o objecto perfurante espetado no abdómen do paciente para controlar a hemorragia, arriscando, nesse processo, a laceração de órgãos vitais, ou se o deixa no local, usando o seu efeito de tamponamento. É idêntico o drama do Dr. Lukas Tishome, que tem que operar uma parturiente que dá o seu consentimento para a cirurgia, mas não para que o clínico retire o colar de missangas que traz debaixo do umbigo, procedimento sem o qual a cirurgia não poderá ser feita.

Aos incidentes causados por erros nos procedimentos ou os dramas de quem tem que tomar decisões, somam-se intromissões de profissionais de outros campos (quando tanto!). Hospital (Contar Clinicando) recorda-nos também episódios, que não são inéditos, de impostores, como o do Dr. Sharif Khan, o cirurgião do Hospital Distrital de Karói, ou de Altos-Comissários que se vão encarregando de lembrar que “todos os porcos são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”.

Ao franquear as portas de acesso ao mundo mítico da profissão médica, com os seus desafios, dramas e dilemas, este Contar Clinicando de Aldino Muianga faz-se também o lugar aonde desembocam outros dramas, os que circulam pelos becos e labirintos de uma sociedade de homens e mulheres que, entre encontros e desencontros, se buscam a si próprios e buscam também a recomposição dos sonhos que a adversidade desmanchou.

Aos corredores do hospital, ao gabinete do clínico ou à sala de operações, efectivamente, o que chega é o drama pessoal da menina que “vivia dias e noites de pesadelos”, apesar da “sua formosura [que] entontencia os magalas e remetia-os a disputas de favores e atenções”, atormentada pela impossibilidade de uma convivência normal por causa dos quelóides que lhe deformam os lóbulos das orelhas. É também “à busca do milagre que restituiria a tranquilidade à família e traria novas perspectivas à vida do filho” que os pais do menino Porfírio, que, por causa das pernas varas, tinha frequentes episódios de depressão, era vítima de abusos dos colegas, que o alcunhavam de “Gorila”, incapaz de uma sã interacção com os menino seus pares na escola e na rua, decidem viajar da cidade da Beira até ao Hospital Provincial de Chinoyi, no Zimbabwe, após tomarem conhecimento das habilidades do ortopedista Dr. Nicolay “o Vitorioso”.

A infertilidade, tema amiúde retratado na literatura (e não só) moçambicana, muitas vezes com a factura a fazer recair o seu peso sobre a mulher, tem também a sua desembocadura neste Hospital. É o que acontece com Ana Brígida, cujo caso chegará ao hospital na sequência das voltas e reviravoltas que dá, depois de um dia ela ter saído acabrunhada e frustrada no cortejo que a devolve à casa dos pais para ser tratada contra a sua incapacidade de gerar filhos, dois anos depois da sua recepção com “ululações festivas” ao lar conjugal.

Numa prosa fluida, a um tempo apimentada e açucarada, rebuscando uma raridade vocabular, um sugestivo adjectivo, uma ironia a convocar o cómico – não o da gargalhada a bandeiras despregadas, mas o que chama um ligeiro sorriso –, Aldino Muianga traz-nos a vasta temática da falsidade nas relações pessoais e sociais. “Um caso de vaginismo” chega ao hospital, atraindo os estarrecidos olhares dos mirones. Aliás, já o vinha fazendo, desde o cubículo alugado no Zimpeto, onde o Pastor Gumende, “estimado e admirado [na sua congregação] pelas suas alocuções no púlpito, onde mobiliza os crentes para o alinhamento e persistência nos cultos e práticas da Fé cristã”, pratica as suas sessões de meditação transcendental, bem como ao longo de todo o itinerário da improvisada ambulância de caixa aberta em direcção aos Serviços de Urgência. Com este caso chega a temática da hipocrisia e da falsidade. Chegam também a traição e o adultério, “confessados” pela imprudência de um delírio pós-operatório, induzido, talvez, por algum anestésico; “denunciados” por um insólito caso de gémeos que nascem como uma disparidade de raças, sendo um negro e o outro “com marcados sinais de mestiçagem”. Na mesma esteira, um intricado caso de multifacetadas e cruzadas traições, chegará, em “Priapismo”, à Clínica Privada de Mutare, com o senhor Milton Gwanyanya, “um bon vivant que se não coibia em exibir as posses e o prestígio que detinha”.

Maputo, 5 de Julho de 2024

A segunda série da Temporada de Música Clássica 2024 decorre nos dias 16, 17, 18 e 22 deste mês de Agosto, na Cidade de Maputo, concretamente no Centro Cultural Moçambique-China, Montebelo Indy Congress Hotel e Biblioteca Nacional de Moçambique.

Nesta segunda edição, o Xiquitsi contará com a participação do renomado Quarteto de Cordas de Matosinhos, que visita Moçambique pela primeira vez e junta-se à Orquestra Xiquitsi para interpretar obras de F.Mendelssohn, F. Schubert ,Vila – Lobos e Benjamin Britten.

Nesta série, a talentosa Maya Egashira promete, segunda uma nota de imprensa, emocionar a todos com a sua interpretação única. Além disso, os alunos do Xiquitsi, Alexandre Munguambe e Khanyile Dimande também trarão toda a sua paixão e dedicação à música para partilhar com o público.

Assim, nos dias 16 e 17 de Agosto, às 19:00 horas, acontecerá a “Noite Clássica”, dois concertos com repertório diferente, no Centro Cultural Moçambique-China.

No dia 18 de Agosto, está marcado o interactivo “Concerto para Pais e Filhos”, às 16:00 horas, no Montebelo Indy Congress Hotel. A entrada será gratuita, proporcionando a oportunidade de desfrutar da música clássica em família.

E para encerrar com chave de ouro, está programada a “Noite Fora de Série”, a 22 de Agosto, às 19:00 horas, na Biblioteca Nacional de Moçambique. Este será um evento de Latin Jazz com entrada livre e uma oportunidade imperdível para apreciadores deste género musical.

Refira-se que o Xiquitsi ambiciona levar o ensino da música para todo o país e isso já está a acontecer através do projecto “Cantate”, nas províncias de Nampula, Cabo Delgado e a seguir em Niassa.

O escritor Eduardo Quive vai participar numa iniciativa pan-africana, entre 12 e 22 deste mês de Agosto, em Abauri, no Gana. O evento é liderado pela escritora Chimamanda Ngozi Adichie.

De acordo com uma nota de imprensa, a Canex Creative Writing Workshop convidou o escritor e jornalista Eduardo Quive a participar da iniciativa pan-africana que reúne criativos e investidores do continente a fim de criar um ecossistema sustentável para as indústrias culturais e criativas.

“Liderada por Chimamanda Ngozi Adichie, a oficina vai reunir cerca de 20 escritores de origem africana e caribenha que vão integrar o workshop de escrita criativa que vai incluir profissionais da área jurídica e empresarial que fornecerão informações valiosas sobre os aspectos jurídicos e comerciais da profissão de escritor”, lê-se no comunicado de imprensa.

Na mesma fonte, lê-se que Eduardo Quive encontra-se entusiasmado em integrar a equipa de escritores: “este workshop tem a profundidade de incluir a componente que nós, os escritores, não gostamos: encarar a escrita como trabalho e, como tal, termos de ser remunerados de alguma forma. E a forma clássica de remuneração, na escrita, são os direitos autorais, os contratos editoriais. Isso leva-nos para outras questões relacionadas ao próprio livro e tudo o que se pode desenvolver à volta. Penso que é por isto, sobretudo, que tenho a vontade de estar neste encontro. E depois vem outro elemento importante, a ligação com o nosso continente. São poucas oportunidades que nos juntam entre africanos, na nossa diversidade e complexidade. Vai ser bom encontrar e conhecer autores africanos e por via disso traçar possíveis rotas de mobilidade para as nossas obras”, disse.

Canex é uma plataforma de apoio às indústrias culturais e criativas africanas (ICC), um programa criado pelo Banco Africano de Exportação e Importação, Afreximbank, em apoio às ICC, em África, que foi especificamente concebido para os criadores africanos, para lhes permitir rentabilizar os seus conteúdos no panorama digital.

O Workshop de Escrita Criativa da Fábrica de Livros Canex colabora com a Fundação James e Grace Adichie e com a Narrative Landscape Press Limited para oferecer este workshop dedicado à arte da prosa. Como parte da iniciativa mais ampla da Fábrica de Livros Canex que se dedica a destacar a cadeia de valor do livro em África, o workshop irá apoiar e desenvolver o talento literário em África e na sua diáspora bem como se tornar um espaço de partilha, discussão e troca de soluções para incentivar os criativos a encontrar formas inovadoras de melhorar os seus rendimentos e fazer crescer as suas carreiras.

Por: Dom Midó das Dores
Escritor de Xitende e do Absurdo, exilado em Mandimba

Segundo Manifesto Metamiserista!

Nós somos miséria em todas as dimensões, para trás, para frente, para os lados, para o lado dos lados, somos a miséria, uma miséria do passado, na qual a história, a memória, a escravatura se ensombram, quais rochedos em mostrengos erguidos como cabeças de velhos, de velhos sarilhos da história! Somos a miséria do futuro, a miséria da falsa esperança dos pântanos do deserto, da morte de ideias da visão do vazio, poeira de estrelas cosmogónicas movida por energia de buracos negros. Nós somos, metade miséria comunista, outra metade miséria capitalista. Entre rios e savanas naufragados no sol acorrentado dos trópicos, nós somos a escória universal africana de todos os demónios expulsos do paraíso e das savanas com almas sagradas de bosquimanos.

Nada espanta, nada arrepia, ser o que somos, a nossa própria miséria. O que pensamos ontem produziu a miséria que somos hoje, o que pensamos hoje e amanhã, é a reprodução da mesma miséria que se eleva ao nível dos deuses! Oh Cisnes do negrismo, doutos e doutores diplomados de todas as ciências da vida, onde está o nosso futuro? Seremos sempre a vendedeira dos passeios da amargura? As mãos tísicas de enxada de cabo curto, como a esplêndida síntese duma evolução? Hoje para o africano a pobreza existencial é o absurdo que dá sentido à própria vida negra. Nós vivemos para lamentar da vida, enquanto o Rover faz selfies no Marte. A nossa arte é de decalcar o juízo final da nossa existência errante, cantando belas elegias de velhos tambores, façanhas e odisseias de novos colonos.

De qualquer forma, neste nosso devir do nada para o nada, a miséria humana há-de ser a alma de cada verso, o início e desfecho de toda criação, porque a pobreza impera truculenta e jocosa, cruel ao sorver a dignidade e o sentido das coisas, oh pobreza, tu vais ser, para sempre, um filho da puta sem tamanho, do erro ontológico em que tornamos.
Esta é a era da bagunça literária, a bagunça do absurdo, da arte das casas de lixo, casas de luxo em rios desurbanizados dos bairros que flutuam à mesma época de cada ano, de repartições onde se trata documentos que para tratar precisam tratar outros documentos, do sangue espargido pelos terroristas que voltam à casa para aterrorizar o saco de amendoim da machamba da avó, arte de sacuderes de lixo que escrevem no mijo de muros, acácias e jacarandás das cidades cosmopolitas do capitalismo Leninista da nossa pobreza. Se nada significa nada, com toda esta insipiência humana, porquê que a arte teria que ter algum significado!

Esta é a era duma nova ordem, em que cessam todas as ordens e se anuncia novos tempos, da proclamação do homem pobre de si mesmo, homem oco por fora e oco por dentro, homem de terno e gravata encobrindo sutiãs cor-de-rosa com bojo e alças rendadas, esta é a era de usar o próprio sangue para escrever de qualquer maneira, deixar erguer-se a voz da morte e do absurdo ontológico em que nos transformamos!

Toda a lógica até agora, produziu a escória que somos, na lógica duns que empobrecem os outros, peregrinos duma história com complexos de vira-lata.
Mas ei-nos que nos erguemos aqui! Ei-nos…

Toda arte é uma voz. Mas, nós queremos é o ruído! Ruído com energia cósmica, que dá energia à nova arte. A nossa condição humana parece uma demência prolongada e não compreendida. Dá a impressão de que em algum momento da nossa desevoluҫão bantu, um xituculumucumba qualquer convidou-nos para um banquete de alienação colectiva, a nossa ciência, a nossa arte, são um processo criativo permanente de reprodução da miséria, da corrupção e da degradação, o nosso desenhismo literário, ainda não conseguiu reconstruir a vergonha que perdemos no percurso histórico da nossa estagnação. Precisamos de tudo para o nosso take-off moral, mas ao menos que os deuses nos devolvessem a nossa vergonha!

Ei-nos aqui! Ermos por uma arte engajada na vida da contracultura que ilumina o nosso entardecer, da vida ébria, vida corrupta e acientífica concumbinada ao sexismo e suas adrenalinas de almas caídas, arte dos párias da canónica homossexualizaҫão africana, do terrorismo abençoado pelo petróleo menstrual dos nossos mares franceses, uma arte de sugger daddies intelectuais, politólogos de políticas sem calcinhas, numa elegia da vida em que os al-shabaab’s da costa, rimam com favas panafricanistas de M23, quando tomam uma coca-cola halal em Mocímboa da fire. Se fossemos filósofos como o Severino, diríamos que a nossa pobreza e a qualidade dos nossos homens, são gêmeos siameses com cabeças diferentes mas partilham o mesmo cú.

Nesta escangalhada condição humana, nós teremos sido o big bang duma nova intuição espiritual, seremos a arte de arremesso, uma arte-slogan duma marcha metafísica por uma revolução ontológica, errupção cósmica de revoltas por nova vibração vital, nova energia existencial duma negritude fundada por um novo futuro, rebeldes de uma rebeldia que está para além do ser, uma rebeldia de refundação de nós mesmo. Nós seremos o tempo que se alimenta da revolução, revolta e rebeldia, numa Escola de 3R`s espirituais. Uma força electromagnética de escrever de qualquer maneira, numa literatura de língua revoltada, para fecundar o novo berço da humanidade!

Nós somos a arte da revolução, revolta e rebeldia…

Arte da revolta e rebeldia

Arte da rebeldia!

O Nós Somos, é o nosso Deus!

Nota: Texto apresentado durante a cerimónia de lançamento do livro.

Neste mês de Agosto, serão publicados dois livros da autoria Celestino Joanguete, da Escola de Comunicação e Artes.

O primeiro livro, intitulado “As mudanças estruturais e de financiamento de serviço público da radiodifusão”, será lançado durante a 51ª Feira do Livro de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, no Brasil.

Publicado pela editora Autografia, o livro conta com um prefácio de Luca Bussotte. Este livro explora as transformações no financiamento e na estrutura dos serviços públicos de radiodifusão, oferecendo uma análise profunda e detalhada sobre o futuro da comunicação pública num cenário de mudanças tecnológicas.

O segundo lançamento é uma prosa literária intitulada “A queda do Macombe Chipapata: tramas e revoltas”. O romance estará disponível nas livrarias da Cidade de Maputo, a partir do dia 20 de Agosto, publicado pela Ethale Publishing, cujo lançamento oficial está programado para Dezembro deste ano.

A prosa é uma narrativa ficcional rica em detalhes, explorando tramas complexas e revoltas que reflectem questões sociais e políticas do imaginário reino do Macombe Chipapata.

O escritor e poeta Whaskety Fernando vai lançar, esta terça-feira, às 18 horas, na Livraria Fundza, na Cidade da Beira, o seu segundo livro. Intitulada “O prazer ao chorar de dor”, a obra será apresentada por Fernando Chicumule.

O livro, de 52 páginas, é composto por 48 poemas que traduzem a tristeza na sua mais variada forma. “Os poemas são tristes”, avisa o poeta aos seus leitores, acrescentando que “quase todos são da noite” e foram arrancados à dor.

Na produção do seu novo livro, de acordo com o autor, o sujeito poético buscava, em cada verso ou em cada poema, um alívio da triste realidade que vivia. Nesse exercício, a alegria residia em “transpor a sombra no chão da vida, onde se é escravo do que se ama, sonha e espera, e de vencer o mar picado no peito, o mar passado a páginas deste livro”, explica Whaskety Fernando.

“O prazer ao chorar de dor” é uma das obras seleccionadas na 3ª Chamada Literária da Editorial Fundza, uma iniciativa que tem vindo a revelar novas vozes na literatura moçambicana. Desde 2022, já foram publicados mais de 40 novos autores de todo o país.

Whaskety Fernando nasceu no Bairro da Munhava, na Cidade da Beira. Já escreveu algumas obras através das quais foi distinguido. Com “O deserto” recebeu menção honrosa no Prémio Literário do Banco de Moçambique, na categoria de poesia. Foi vencedor do Prémio Literário “A língua que nos une”, com a obra de poesia “Apontamento para um romance de paz”, e a novela “Noites de desassossego” foi finalista no Prémio Literário Fernando Leite Couto.

O Ministério da cultura e turismo e o artista plástico Ernesto Matsinhe Mafuiane (Butcheca)  lançaram, sábado, no contexto da décima edição da feira internacional de turismo “FIKANI”, uma capulana,  que teve como base de inspiração uma obra de arte, no caso um quadro de pintura.

Uma obra de arte que deu origem à capulana colorida, que só pelas suas cores vivas já se destacava. Edelvina Materula, Ministra da Cultura, fez saber que a ideia de replicar  a obra de arte em múltiplas capulanas tem o objectivo de proporcionar o acesso à arte  trazendo, assim,  ganhos e valorização.

“Aos artistas plásticos e outros criativos moçambicanos e, ainda, ao empresariado nacional, queremos deixar a mensagem de que a arte, a cultura e a criatividade podem ser fontes de negócio e de geração de rendimentos. Pelo que, sejamos proactivos em realizar negócios nesta área. Facto que já vem ocorrendo com a cessão de direitos de cópia para obras de arte plástica na Literatura Nacional”, disse Materula.

A ministra acrescentou, ainda, que “a Capulana Butcheca encontra-se exposta na Feira FIKANI, no stand do Instituto Nacional das Indústrias Culturais e Criativas, pois é desta forma, e em locais como este, onde devemos capitalizar, promover e valorizar a nossa arte e os nossos artistas. Chegados aqui, quero em meu nome pessoal e em nome do Ministério da Cultura e Turismo, declarar oficialmente lançada a Capulana Butcheca. Um bem-haja a todos os artistas e criativos moçambicanos”.

Já o autor da obra, Butcheca, explicou que a réplica do quadro em capulana simboliza vida. “As cores, o vermelho que representa vida. Sem esquecer também das serpentes que representam a cura, então, esta obra é vida”.

Butcheca deixou um apelo para que os artistas plásticos, sobretudo os mais novos, imprimam às suas obras para ganharem mais renda.

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