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Crítica: Melodias curvilíneas*

Por: Natércia Manhenje

 

Nas telas que nos são apresentadas, Mourana nos oferece uma poesia lírica cantada através de traços únicos que fazem uma ode à Mulher e ao que de mais profundo e belo ela pode representar e apresentar. A música está patente de forma explícita em alguns quadros e de forma implícita em quase todos os quadros onde vemos representado o sorriso, a alegria, a escuta, a dança, a melodia, o amor e até um olhar de esguelha.

Pode-se dizer que cada quadro apenas se encontra acabado depois de analisado pelo observador, tendo em conta o momento e o diálogo travado entre ambos. Um diálogo que dispensa a figura do artista, que se isola, totalmente da tela e deixa o seu outro Eu navegar num mundo que nem ele mesmo conhece, mas que é movido por esse Eu que o leva a desencadear uma série de traços, aparentemente sem significado, mas que se vão unindo, trazendo realidades que só quem os vê, aprecia e analisa, os consegue alcançar. Em cada traço e mistura de cores nota-se um discurso misterioso, que melhor se entende com uma observação mais cuidada e profunda.

Trata-se de uma exposição essencialmente figurativa, que contém raízes profundas no mundo real com um toque de grande misticismo, regado com toque de crítica social virada para o mundo globalizado, como o quadro garotas da Town, por um lado e, de forma particularizada, como é o caso dos quadro Filhas da Lua, e ainda de forma especializada, como o caso dos quadro Xiguiane.

Sua técnica, que é bem persuasiva e com uma característica muito pessoal e de estilo que o enquadra no mundo surreal, com a particularidade de nos levar para um caminho sem retorno e sem vontade de voltar ao mundo real. O uso de cores e formas, que nos levam a interpretar de um modo mais amplo tudo o que está em nosso redor, nunca descurando o seu próprio estilo e traço, levam a cada um a transportar-se para um infinito de imagens de um modo aberto, criando emoções que exaltam a alma, em consonância com as suas vivências.

A mulher e a música casam nas telas de Mourana e trazem um elemento arquitectónico que abre outras realidades, que muitas vezes são apresentadas em situações inusitadas, numa combinação de fragmentações e montagem do real, desarticulado, suscitando o estranho, de uma imagem que é ao mesmo tempo nova e familiar.

Cada tela é como um capítulo solto de uma obra completa, mas, ao mesmo tempo em construção, levando-nos a uma viajem que pode surpreender, a cada momento, criando a espectativa de uma obra progressiva.

O convite a genesis com a representação de parte de criação do mundo com Pecado de Adão que nos sugere de onde tudo começou, até a Longa espera de uma realidade escondida no Livro dourado da sereia onde pode se antever uma Peregrinação infinita, em melodias surdas que nos levam a hoyozelar a filha da lua com a magia dança da Bailarina divina sob o Olhar de esguelha das siamesas nos levam das emoções de um Lirismo amoroso ao apocalipse da Metáfora do amor das Melodias Curvilíneas.

 

*Texto lido na sessão de abertura da exposição “Melodias curvilíneas”, de PMourana, na FFLC, no dia 5 de Março de 2024.

 

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