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“Caso o Governo recorra a médicos militares e estudantes, poderá haver greve geral”

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Os pacientes dos hospitais da Cidade de Maputo chegaram a esperar mais de seis horas para serem atendidos nos serviços de urgência. A situação deveu-se à greve dos médicos. A Associação Médica de Moçambique denunciou a substituição de médicos em greve por militares e estudantes de medicina. A agremiação ameaça paralisar todos os serviços caso o cenário continue.

O primeiro dia da greve dos médicos sugeria a normalidade, ainda que condicionada, nos hospitais da capital do país e sem impacto sobre os pacientes.

Nesta terça-feira, a greve dos médicos ganhou outros contornos. Os pacientes chegaram a esperar mais de seis horas para serem atendidos.

“Cheguei ao hospital por volta das 07 horas, mas, até agora (eram 14 horas), ainda não fui atendida. Ninguém se digna a dar satisfações. Basta entrar um paciente, leva muito tempo. Não há nenhum resultado”, reclamou Helena Eduardo, que aguardava por atendimento no Hospital Geral de Mavalane.

Naquela unidade sanitária, os pacientes não sabiam nem faziam ideia de por que o atendimento estava moroso, mas a directora clínica tinha uma explicação: “Continuamos a fornecer os serviços mínimos. Temos um médico no serviço de urgências e outro na sala de observação. No dia de hoje, há uma ligeira demora, mas os médicos estão a atender”, justificou Maria Helena, directora clínica do Hospital Geral de Mavalane.

Os médicos do Hospital Central de Maputo (HCM) também continuam a atender, mas em número reduzido. A espera por uma assistência médica é longa. “Ao chegar, vai ser bem recebido, mas depois vai ser arrumado. Em todas as enfermarias por onde passei, não há médicos a atenderem”, denunciou António Guambe, um dos pacientes que aguardou mais de cinco horas para ser atendido.

A direcção do HCM não dava justificação pela demora no atendimento. “Essa demora não é normal. Perguntámos sobre o que se passava, mas eles disseram que só havia um médico. É a única informação que nos foi dada”, referiu Rosa Mucavel, paciente que estava no banco de espera no Hospital Central de Maputo.

O director dos Serviços de Urgência da maior unidade sanitária do país diz que a demora tem a ver com o processo normal de triagem, mas a situação agravou-se com a greve dos médicos.

“Associado à demanda que temos devido à défice do pessoal, estica-se um pouco a hora para sete ou oito horas, mas nós estamos a ser flexíveis para atender a todos os doentes. Agora, nós estamos com um médico na triagem, um no balcão e outro na sala de ressuscitação. Este número não é suficiente para cobrir a demanda, porque temos tido cinco a seis”, reconheceu Dino Lopes, director dos serviços de urgência do HCM.

Os serviços de urgências do Hospital Geral José Macamo estavam a fluir e, ao contrário do que se tinha dito, as consultas externas estavam a ser feitas.

“O que estamos a fazer é uma acomodação conforme os médicos e técnicos que temos disponíveis. Há algumas ausências, mas temos médicos para atender e hoje  é o meu dia de atender às mulheres grávidas”, explicou Andrea Neves, directora clínica do Hospital Geral José Macamo.

E as mulheres doentes e não grávidas não são prioridade no atendimento do Hospital Geral José Macamo. “Eu estou doente. Tenho miomas, mas sempre me mandam voltar. À última vez, marcaram para o dia 06 de Dezembro e, chegado ao hospital, mandam-me voltar e até ao próximo ano. Eu estou com dores”, reclamou uma paciente do Hospital Geral José Macamo, na condição de anonimato.

De acordo com os dados da Associação Médica de Moçambique, mais de dois mil médicos aderiram à greve em todo o país.

Para preencher os espaços deixados pelos médicos grevistas, denuncia a agremiação médica, os hospitais recorrem a militares e estudantes de medicina. “Isto pode incorrer numa situação em que haverá danos específicos contra os doentes, na medida em que estes indivíduos não estão credenciados, não têm competências para poder observar doentes. Vemos situações em que são passadas receitas erradas aos pacientes e isso é um perigo para a saúde pública a nível nacional”, acautelou o secretário-geral da Associação Médica de Moçambique, Napoleão Viola.

Além de colocar em perigo a saúde pública, esta atitude poderá provocar uma greve geral dos médicos antes de se esgotarem os 21 dias anunciados.

“Havendo situações de violação dos princípios da greve, há espaço para que possamos ir a uma greve total em que todos os serviços não serão garantidos. O Governo, dado que se coloca numa posição em que acha que tem capacidade para continuar a prestar serviços, apesar da greve, vai achar melhores soluções que quiser”, ameaçou Napoleão Viola.

O recurso a médicos militares e estudantes de medicina para substituir os profissionais em greve está a acontecer nos hospitais gerais, provinciais e centros de saúde, sobretudo da Cidade de Maputo.

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