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Investir na juventude é imprescindível para colocar tecnologia ao serviço da indústria

Intervenientes da Moztech 2020 defenderam esta quarta-feira que o investimento na mudança de mentalidade da juventude, a formação de pessoas e a capacitação das Pequenas e Média Empresas (PME) são fundamentais para a rápida transformação industrial através de ferramentas tecnológicas. Para tal, é necessário que exista uma forte liderança.

No debate sobre os Caminhos da Industrialização em Moçambique: Inovação, Modernização e Digitalização, o Presidente do Conselho de Administração (PCA) da Fundação Soico (FUNDASO) defendeu que é necessário investir na atitude das pessoas e na mudança da mentalidade para impulsionar a industrialização e tornar os produtos nacionais competitivos.

O pensamento é partilhado num contexto em que vários países procuram encontrar as melhores ferramentas para alavancar suas indústrias de modo que sejam mais competitivas. Com as restrições impostas pela pandemia da COVID-19, esta necessidade de maior industrialização da economia, tendo como aposta a tecnologia aumentou.

Nos países africanos, como por exemplo Moçambique, há que acelerar ainda mais o passo, atendendo os desafios persistentes. Segundo o Presidente do Conselho de Administração da Fundação Soico é necessário “queimar” etapas através da transformação tecnológica.

“Se nós não investirmos nas atitudes das pessoas e na mudança da mentalidade sobre o contexto que nós vivemos agora, que é global, não daremos nenhum salto. É fundamental o papel das lideranças porque elas dão a indução (as lideranças políticas, as lideranças governamentais e as lideranças académicas). Nós não podemos estar numa universidade em que o professor continua a ter exemplos de formas de estar dos tempos da Ford, quando produziu os carros. Que perceba que está aqui para catalisar, potencializar e impulsionar a mente do estudante para ter uma mente muito mais aberta. Porque, agora, qualquer pessoa pode aprender tudo o que quiser via internet, como foi dito, o importante é como catalisamos e potencializamos as mentes humanas”, disse Daniel David.

O PCA da FUNDASO referiu, de seguida, que só haverá dividendo demográfico que tanto se fala no país se se tirar maior proveito da juventude. “Se não tirarmos valor dessa juventude, apenas será uma narrativa política de que Moçambique tem uma base da pirâmide próspera ou que pode prosperar. Só pode prosperar se transformarmos as mentes. Penso que nesta altura em que Moçambique se encontra é fundamental que todas as pessoas que lideram os processos transformacionais percebam que temos que induzir a juventude para que ela possa ser criativa e induzi-la naquilo que são os conhecimentos básicos”, explicou David.

Para que as ideias sejam colocadas em prática, o contributo dos jovens empreendedores é chamado e o Presidente do Conselho de Administração da Fundação Soico deixa ficar algumas conselhos sobre onde esse grupo pode começar e do que é ser empreendedor.

“Defendo que um empreendedor deve ter a capacidade de ver uma árvore dentro de uma semente. Se ele tiver essa capacidade e regar, adubar e fazer com que ela cresça, brote e produza frutos, esse que tem essa visão é um grande empreendedor. Em termos concretos, olho para aquilo que o país é hoje: o nosso país é quase rural; tem alguns centros urbanos; tem dificuldades em termos de densidade populacional; nas zonas rurais as pessoas estão muito espaçadas e nas zonas urbanas estão mais concentradas. Os empreendedores devem olhar para a situação real e ver onde é que estão as oportunidades e o que é que está a falhar e a partir daí, o que é que pode agregar para transformar essa realidade”, disse Daniel David.

O PCA da FUNDASO explica ainda o que leva a Fundação a promover debates sobre o papel da tecnologia no processo da industrialização, tendo começado por explicar que a organização tem como a sua base os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), fundamentalmente, com um pilar importante, que é o seguinte: ‘só pode haver transformação quando tivermos a capacidade e a tecnologia a agregar essa transformação’.

“Sem a transformação, com o impacto na sociedade, não podemos desenvolver. E neste momento, com o lançamento desta 7ª edição da Moztech queremos apoiar, impactar e tentar dar o nosso contributo no país, naquilo que é um pilar fundamental do desenvolvimento, a industrialização. O nosso papel é esse, tentarmos apoiar e agregarmos valor àquilo que são as políticas de desenvolvimento do país”, esclarece o PCA da Fundação Soico.

Por sua vez, o presidente da Associação Industrial de Moçambique (AIMO) aponta a “diplomacia industrial” como a chave para a modernização. No entender de Rogério Samo Gudo, produzir com preços competitivos é a bandeira dos industriais, por isso, para haver transformação é preciso que haja um casamento permanente entre a indústria e a tecnologia.

“Uma das primeiras actividades que nós desenvolvemos como a nova direcção da AIMO foi trazer os membros e discutir uma visão como associação e através dessa visão traçamos um plano estratégico que tem como um dos pilares principais a modernização da indústria. É óbvio que para modernizar a indústria nós precisamos de também desenvolver uma diplomacia industrial, o que significa que precisamos de socializar aquilo que são os desafios, mas também as oportunidades, através de debates como esses e através de parceiros”, disse Rogério Samo Gudo.

Um desses parceiros, segundo o presidente da AIMO, é a FUNDASO que para a Associação “é essencial por ter uma visão do país e uma visão de desenvolvimento social e económico” que vai ao encontro das directrizes do organismo industrial. “Achamos que seria um parceiro ideal para um conjunto de projectos que nós temos nesse nosso mandato”, considerou Rogério Samo Gudo. Para que o caminho esteja iluminado, o líder da associação industrial sugere ainda uma maior cooperação entre os players envolvidos na inovação industrial.

“É preciso desenvolver um ecossistema industrial para que tudo gravite dentro dele. Todas as instituições precisam colaborar. A palavra-chave é colaboração. Sem colaboração não há indústria. Quando falamos do sector primário é preciso que haja noção do papel que outros sectores, secundário e terciário que estão na nossa economia têm. Não podemos ser dissonantes; não se trata de um sector ou de um ministério, mas de um país e de uma economia. Se a nossa visão é agregar valor nas nossas matérias-primas, naquilo que se chama industrialização, tem de ser uma visão de todos , da Nação”, defende o presidente da AIMO.

Os dois intervenientes foram painelistas no debate sobre Caminhos da Industrialização em Moçambique: Inovação, Modernização e Digitalização na 7ª edição da Moztech sobe o lema Tecnologia ao Serviço da Industrialização, que arrancou ontem, desta vez num formato diferente, através de transmissão na televisão e de plataformas digitais.

Por sua vez, das terras lusas, o professor Adriano Freire, presidente da Strat&Egos Institute de Portugal, juntou-se ao painel de debate sobre Caminhos da Industrialização em Moçambique: Inovação, Modernização e Digitalização para sugerir que Moçambique capitalize o facto de ter população maioritariamente jovem para dinamizar a sua indústria.

“A questão que está por de trás desta transformação digital, transformação através da tecnologia, no sector empresarial moçambicano, obviamente, passa pela formação. Temos aqui um conjunto muito grande de pessoas com a capacidade de adaptação, com a facilidade de entrar no negócio digital, quer pelo uso normal dos telemóveis, quer pela facilidade de compreender essas novas tecnologias, que podem e devem ser potenciadas para facilitar a evolução das novas tecnologias porque as novas tecnologias e os novos equipamentos são cada vez mais digitais”, apela Adriano Freire, presidente da Strat&Egos Institute de Portugal.

Dando como exemplo a indústria portuguesa do calçado, Freire aponta os passos que Moçambique pode dar no processo de industrialização. Em Portugal, quem tomou a liderança foi a Associação Industrial do Calçado que percebeu que havia muita pecuária (produção de gado), havia muita produção de couro e curtumes, que não eram devidamente aproveitados.

“A maior parte das matérias-primas eram exportadas e depois, outros países, França e Itália faziam os tais calçados com as matérias-primas portuguesas e tinham o valor acrescentado associados a esses produtos”, explicou Freire, num exemplo que se adequa à realidade moçambique, já que muitos produtos são exportados antes de serem transformados.

Um dos exemplos de liderança apresentados pelo professor tem a ver com a busca, com apoio da Associação Industrial do Calçado de Portugal, de desenhos que estavam acessíveis na internet, para o negócio dos têxteis, que não estava a ser bem-sucedido e aliaram-nos às novas tecnologias para procurar produzir, naquele país, calçados ou sapatos dentro das tendências internacionais e o resultado foi satisfatório para os portugueses.

“O Centro Tecnológico do Calçado passou a fazer cada vez mais formação em novas tecnologias. Por exemplo, era lançada uma nova máquina no estrangeiro e como os portugueses não tinham o equipamento necessário, importava-se o equipamento e imediatamente os centros tecnológicos do calçado faziam formação para alguns jovens com a capacidade de aprendizagem, para eles aprenderem a lidar com aquelas máquinas e essas máquinas passaram a ser partilhadas por empresas em Portugal. Ou seja, criou-se uma liderança que puxou pelas empresas, fomentou a cooperação e em alguns anos, os sapatos portugueses começaram a ter mais aceitação internacional; os preços do calçado português começaram a subir e hoje em dia, no nível médio de preços o calçado português é o segundo maior do mundo”, falou da experiência, o presidente da Strat&Egos Institute de Portugal.

 

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