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A triste sina dos mototaxista de Nampula e Manica

Treze pessoas assassinadas, dezenas de motorizadas roubadas e a desgraça que se abraça sem largar os jovens desempregados. Por que é que a motorizada é tão especial no Centro e Norte do país?

Uma motorizada é capaz de mudar a vida de um jovem. Isso mesmo, a motorizada no Centro e no Norte do país vale mais que uma simples motorizada. É meio de transporte, símbolo de emancipação na zona e fonte de renda na família.Egas Gonçalves personifica tudo que dissemos. Há nove anos que tem na motorizada a sua fonte de renda. Vive literalmente na rua porque é mototaxista, mas à noite repousa numa casa de alvenaria que construiu com o rendimento do pequeno veículo motorizado de duas rodas.

“Estive a trabalhar, mas depois fiquei desempregado em 2014. A única forma que vi de me enquadrar na sociedade foi fazer taximota. Comecei com uma mota pequena, quase podre, e dessa mota pequena comecei a desenvolver, comprei a segunda motorizada, comprei a terceira a quarta que é esta”.

Dá o testemunho à nossa reportagem e enquanto fala da quarta conquista, acompanha apontando com o dedo a motorizada nova que a adquiriu há um ano e lhe custou 85 mil meticais. De seguida, faz um elogio à máquina que lhe dá dinheiro diariamente.

“Significa muito porque é daqui que consigui construir a minha casa e criar meus filhos. Tenho uma casa de 12 por 8 metros, composta por quatro quartos e tenho três filhos”.

As motorizadas mais pequenas custam entre 30 e 35 mil meticais na loja. A de Hussene destaca-se pelo porte (maior) e conforto que atrai mais os passageiros. No Centro de no Norte do país o serviço de táxi é assegurado maioritariamente pelas motorizadas. É daí que nasce o conceito de “mototaxista”.

“Na cidade de Nampula temos 3118 operadores de táximota que estão em 146 praças”, atira o número no decurso da entrevista para justificar o que se vê em quase todas as esquinas da cidade de Nampula. É Albertino José – presidente da Associação dos Mototaxistas de Nampula.

Os mais de 3 mil operadores de taximota são os que estão registados numa das associações, o que significa que no concreto há muito mais que isso. As viagens mais curtas custam entre 20 e 30 meticais e a motorizada acaba sendo o meio de transporte mais popular na zona Centro e no Norte devido à facilidade de entrar nos bairros onde o transporte semi-colectivo de passageiros não chega. Mas por detrás da actividade, há um grande risco. Em quase todos assaltos há um denominador comum: os criminosos fazem-se passar por passageiros, acontecem de madrugada ou à noite.

Na primeira pessoa falam os que passaram maus bocados nas mãos dos criminosos. Calton Joaquim – mototaxista: roubaram minha mota. Foi em frente à Escola Secundária de Nampula.Quando chegamos ao destino ele segurou-me pelo capuchinho, tirou uma garrafa no casaco e partiu na minha cabeça. De repente apareceram os amigos e roubaram minha motorizada.

João Goariate – mototaxista: levando a ele até ao destino, surpreenderam-me com duas motas e as pessoas desceram e me catanaram.

Gabriel Roda – mototaxista: chegamos lá e encontramos duas pessoas à espera. Tiraram catanas e tive que deixar minha motorizada e fugi. Os casos mais graves terminaram com a morte de mototaxistas.

Até aqui, há registo de sete jovens que cairam na desgraça dos criminosos.Geneco Cornélio descreve com amargura a forma brutal em que encontrou a morte o seu colega de praça que foi mais uma presa dos criminosos.

“Levou as pessoas até à zona de Muriaze, no distrito de Mogovolas. Ao chegar lá, foi assaltado. Tinha cortes nas pernas, nas mãos e no pescoço”.

“Temos registo de sete colegas que foram assassinados, mas acreditamos que o SERNIC tem mais dados”, lamenta Albertino José e em nome da associação dos mototaxistas de Nampula desencoraja o trabalho nos períodos de risco.

ASSASSINATOS TENDEM A REDUZIR EM MANICA

Banhada de lágrimas, Rosa José chora pelo seu filho, King Paulo que exercia a actividade de mototaxi e morreu em pleno exercicio da sua actividade na cidade de Chimoio. King deixou quatro filhos menores e esposa grávida.

“Eu gostaria mesmo de ver as pessoas que mataram meus filho. Assim estou a chorar, desde esse dia nem na machamba consigo ir, estou doente assim”, lamenta José, clamando por justiça no caso.

Com a actividade que exercia, King era verdadeiro rei na familia, conseguia prover sustento para seus pais, esposa e filhos. Agora a mãe teve que se reinventar. Fabrica e vende bebida tradicional aqui conhecida por dhoro e também faz negócios de pequena montra. O pai lamenta a forma bárbara como King foi assassinado.

“Tinha um sinal de ter sido batido. Bateram na cabeça, toda a cabeça estragaram. O resto do corpo estava bom. Levaram a motorizada”, disse.

King faz parte das seis pessoas que este ano foram assassinadas na cidade de Chimoio, segundo Neto Chiganda, Presidente da Associação dos Mototaxistas na capital de Manica.

“Levam cliente para uma zona chamada Kutchi e lá são assassinados e levados as motas. Esse ano são seis pessoas que foram assassinadas”, disse ChigandaMuitos mototaxistas são assassinados durante a noite.

Neto Chiganda diz que os mototaxistas trabalham até altas horas para poder completar a receita dos seus patrões, muitas vezes fixada entre 2000 a 2500 meticais por semana.Nos primeiros três meses do ano passado 11 mototaxistas foram assassinados em Manica, contra seis de igual periodo deste ano.

Neste Chiganda diz que isso resulta da intensificação de patrulhamento pela Policia da República de Moçambique (PRM), que em coordenação com a associação que dirige têm estado a fazer de tudo para acabar com esse tipo de crimes. Aliás, ha cerca de duas semanas, a Polícia apresentou um grupo de oito pessoas indiciadas no assassinato a mototaxistas nos distritos de Báruè, Chimoio, Gondola e Vandúzi.

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