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Sobre regalias de dirigentes e ex-dirigentes 

Ao choque e estupefacção generalizada do país perante a dura e inaceitável verdade de que os direitos e regalias dos dirigentes superiores do Estado são prioritários mesmo perante a miséria e o sofrimento da esmagadora maioria dos cidadãos, o esclarecimento do Governo foi estarrecedor.

“São compras de 2015, foram feitas antes da suspensão do apoio por parte dos parceiros e só 6 viaturas são deste ano”, sentenciou o Secretário Permanente do Ministério da Economia e Finanças. Em 2005, lê-se pelas palavras deste zeloso SP, éramos tão ricos que era normal gastar 90 milhões de meticais no bem-estar de meia dezena de dirigentes.

Esqueceu-se o bom do SP que, a 15 de Janeiro desse mesmo ano 2015, no discurso da sua posse, o Presidente Nyusi prometera ter um governo austero (e não é austero Governo que gasta 90 milhões de meticais em 39 viaturas num país onde o povo sossobra no “My Love”); que nove meses depois, mais exactamente a 29 de Outubro desse mesmo 2015, o Presidente Nyusi revelou, no jantar dos 20 anos do BIM, que encontrara os cofres do Estado vazios e era o presidente que estava a governar em piores condições na história recente do país (que rico cofre vazio, senhor presidente!).

Então, bem vistas as coisas, nada mudou entre 2015 e 2017: há dois anos, o Estado estava com os cofres vazios e numa governação difícil e, ainda assim, encontrou espaço para financiar uma despesa supérflua.

Este ano, as finanças públicas estão em derrapagem, não há doadores para cobrir o défice e o Governo financia-se à custa de um cada vez mais insustentável recurso ao endividamento interno. Em consequência disso, cortou de forma significativa na despesa, na contratação de novos funcionários, mas encontrou folga para pagar 29 milhões por 6 viaturas, duas das quais para um antigo primeiro-Ministro e um antigo Presidente da Assembleia da República, que custam, juntas, quase 22 milhões de meticais.

O problema não tem nada a ver com o contexto, mas sim com hábitos há muito enraizados num Estado em esvaziamento, em que a dignidade dos dirigentes se mede pela dimensão da cilindrada e preço da viatura que lhe está afecta. O problema é que as contas do Estado não são independentes da sua economia.

Um país com uma economia em coma profundo, como o admitiu há uma semana o Governador do Banco de Moçambique, dá-se ao luxo de distribuir Mercedes e outras marcas pelos membros da Comissão Permanente do Parlamento e seus cônjuges e gastar perto de 22 milhões de meticais por apenas dois antigos dirigentes.

Se juntarmos as regalias e remunerações de todos os antigos presidentes da República, presidentes do parlamento, primeiros-ministros, ministros, procuradores-gerais, aos actuais incumbentes nos mesmos cargos, ficamos com uma soma certamente assustadora, mas que ninguém conhece a sua verdadeira dimensão.

Infelizmente, há uma espécie de pacto de silêncio dentro do poder político para manter em segredo a lista dos antigos dirigentes que recebem as chamadas pensões “douradas” ou subvenções mensais vitalícias, os valores que aqueles recebem, bem como as regalias associadas.

É esta a reflexão que se impõe: pode um país como o nosso dar-se ao luxo de sustentar os devaneios de antigos e actuais dirigentes e ainda atender às necessidades básicas dos seus cidadãos? É justo para os inúmeros cidadãos honestos deste país, que trabalham uma vida inteira de sacrifícios, sustentarem, vitaliciamente, as extravagâncias dos seus dirigentes, só porque estes estiveram cinco anos num cargo público?
Urge, pois, construir uma plataforma de entendimento entre o Governo e o Parlamento sobre a necessidade de revisão da legislação sobre os direitos e regalias dos dirigentes superiores do Estado para a ajustar às condições económicas do país. Um cargo político não é um emprego.

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