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Terrorismo assola Cabo Delgado há três anos

Passam hoje três anos desde que um grupo armado iniciou ataques em alguns distritos de Cabo Delgado. Centenas de pessoas já morreram, outras perderam bens e várias infra-estruturas foram reduzidas a escombros. Ainda são desconhecidas as reivindicações e motivações do grupo que tem estado a semear terror e luto naquela província.

Na madrugada de 05 de Outubro de 2017, pessoas desconhecidas – e até hoje sem rosto – iniciavam ataques no distrito de Mocímboa da Praia. Na altura avançou-se que mais de 30 homens armados atacaram três unidades da Polícia da República de Moçambique (PRM), incluindo o comando distrital local. Cinco pessoas morreram.

Para garantir segurança da zona, um contingente das Forças de Defesa e Segurança foi destacado para aquele distrito no sentido de repor a ordem, bem como em todos os pontos estratégicos de Mocímboa da Praia.

Depois de algumas investigações, em Novembro daquele ano, as autoridades concluíram que se devia fechar algumas mesquitas, por suspeitas de terem sido frequentadas por membros do grupo armado terrorista.

A ordem, com efeitos imediatos e por um período indeterminado, foi emanada pela Direcção Provincial de Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Cabo Delgado, e visava três mesquitas localizadas na cidade de Pemba.

O tempo passou. O que parecia um ataque isolado, aos poucos tornou-se um problema da dimensão que hoje atingiu. Os ataques alastraram-se para outros distritos, nomeadamente Macomia, Palma, Nangade, Quissanga, Meluco e Metuge.

No distrito de Quissanga, por exemplo, todas instituições do Estado encerraram as portas. Há meses estão a funcionar provisoriamente no distrito de Metuge, devido a insegurança provocada pelos ataques terroristas, conforme narrou o respectivo administrador distrital, Bartolomeu Muibo.

Não se tem números reiais sobre as perdas humanas e materiais. O certo, porém, é que as comunidades daqueles distritos vivem num ambiente de cortar à faca e de ranger os dentes.

Os terroristas matam e torturam as suas vítimas. Destroem, queimam bens e infra-estruturas. O medo instalou-se e toda a gente está com as mãos à cabeça, clamando sempre pelo socorro.

Em Junho de 2018, o Presidente da República deslocou-se a Cabo Delgado e pronunciou-se publicamente sobre o assunto. Disse que as Forças de Defesa e Segurança estavam no terreno para conter a situação. Filipe Nyusi disse ainda que haviam indivíduos que se concentravam no mato e instrumentalizam jovens para fazer mal às comunidades.

Na ocasião, o Chefe de Estado apelou à população para ficar atenta e denunciar os malfeitores. Aliás, de lá a esta parte, Filipe Nyusi não só tem criticado a situação e apontado os males que dela resultam, como também tem manifestado abertura do Governo para o diálogo de modo a acabar com o sofrimento da população de Cabo Delgado. O mesmo acontece em relação às províncias de Manica e Sofala, onde o espectro de guerra tira sossego há mais de um ano.

Em Abril deste ano, o Conselho Nacional de Defesa e Segurança de Moçambique assumiu que o país enfrentava uma agressão externa perpetrada por terroristas em Cabo Delgado.

No domingo, aquando da celebração dos 28 anos da assinatura do Acordo Geral de Paz, em Roma (Itália), o Presidente da República disse que o Executivo mantém o compromisso de “continuar a reforçar a capacidade de intervenção militar e a projecção do poder das Forças de Defesa e Segurança para que possam dar resposta cada vez mais eficiente às investidas dos terroristas”.

Em conexão com essa violência armada, pelo menos 250 pessoas foram julgadas mas este processo não permitiu saber, efectivamente, quem são os mandantes, nem as motivações e reivindicações. O primeiro processo julgado arrolava 189 arguidos, dos quais três morreram. Dos que foram julgados, mais da metade foram absolvidos por insuficiência de provas.

A informação foi confirmada pelo Tribunal Judicial da província, que já tramitou 11 processos crimes contra supostos membros do grupo armado instalado em Cabo Delgado desde 2017.

“Desde o princípio, já foram julgados e condenados cerca de 122 réus e foram absolvidos cerca de 130 réus. Portanto, este grande número de réus absolvidos faz parte dos 186 réus do processo 32/2018 que foi o primeiro a ser julgado”, revelou Zacarias Napatima, porta-voz do Tribunal Judicial da Província de Cabo Delgado, em Setembro passado.

A fonte esclareceu que o elevado número de réus absolvidos tinha a ver com a inexperiência dos órgãos de justiça, uma vez julgaram ou julgam casos de terrorismo pela primeira vez.

Os julgamentos relacionados com os ataques terroristas iniciaram em Outubro de 2018, e os réus foram condenados a penas que variam de dois a 40 anos de prisão maior pelos crimes contra segurança do Estado, contra organização do Estado, instigação a violência e desobediência colectiva, porte de armas proibidas entre outros.

Entre os condenados, estão homens e mulheres entre cidadãos nacionais e estrangeiros, sobretudo Tanzanianos, Somalis e Burundeses.

Sérgio Chichava, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), disse que, apesar de não se conhecer os autores do crime, é possível, através das pistas deixadas, aproximar e conversar com os mesmos.

“Uma das formas de se contrapor esta acção dos insurgentes é o diálogo, penso que isso vai minimizar perdas humanas e destruição de infra-estruturas e o sofrimento das populações, precisamos encontrar formas para dialogar, e sabermos o que querem”, disse Chichava.

Os ataques chamaram atenção de todos. Da imprensa internacional, organizações internacionais, do líder da Igreja Católica, do Congresso Europeu e da Amnistia Internacional que há semanas acusou as Forças de Defesa e Segurança de violar os direitos humanos, nas zonas de confronto.

Recentemente o Governo moçambicano enviou uma carta a pedir ajuda à União Europeia para combater o terrorismo em Cabo Delgado e aguarda uma reposta.

Os ataques terroristas em Cabo Delgado e os da auto-proclamada Junta Militar da Renamo, em Manica e Sofala, já causaram mais de 368 mil deslocados, o equivalente a 73 mil famílias, segundo dados do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC).

As províncias de Niassa, Cabo Delgado e Nampula são as que detêm maior número de deslocados, sendo que só Nampula tem mais de 15 mil.

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