Ragendra de Sousa está de volta às análises económica públicas, cerca de dois anos após deixar de ser ministro da Indústria e Comércio. Como sempre, sereno e sem reservas, o economista critica a falta de profissionalismo no comércio externo e a falta de clareza sobre os produtos a vender para o mundo.
“Nós temos que expor o país de forma mais profissional. Actualmente, [a exposição] tem características de amadorismo. Só para ter uma noção, quando eu fui à China, percebi que tínhamos levado para lá como produto de exportação, ‘hambúrguer de badjia’, ah meu Deus”, espantou-se Ragendra de Sousa.
Na ocasião, o então ministro da Indústria e Comércio descobriu que a delegação que liderava no país asiático tinha o tal ‘hambúrguer’, que se quer movimenta somas elevadas de dinheiro dentro do país, como uma das suas bandeiras do comércio externo, ou seja, o que melhor sabe fazer para vender.
“Fomos à China para expor a nossa capacidade, no entanto voltamos a levar caju, madeira, etc. Para isto, é preciso dar a volta e mostrar, profissionalmente, qual é o potencial, quais são as reservas e como se faz”, entende o antigo ministro da Indústria e Comércio e economista.
Ragendra diz que as direcções do Ministério da Indústria e Comércio deviam estar mais capacitadas para vender melhor as potencialidades do país. “As pessoas estão lá e têm formação. Não é preciso o ministro ir à televisão dizer isso. É trabalho dele saber que ‘hambúrguer’ de badjia não é produto de exportação”.
Para mudar a situação, Ragendra de Sousa, acabado de sair da direcção máxima do Ministério da Indústria e Comércio, aponta saídas, entre as quais a formação das pessoas, porque, para o caso em apreço da China, explica que as reuniões de preparação da visita foram feitas.
“Isto quer dizer que a profissionalização e a necessidade de qualidade dos quadros para servir o Estado têm de ser a mais alta prioridade, porque, se não, vamos ter aquela situação em que o ministro tem de saber tudo e fazer tudo, o que não é possível”, concluiu o antigo governante.
Dados do Banco de Moçambique que constam do mais recente relatório de Conjuntura Económica e Perspectiva de Inflação indicam que a melhoria da procura externa impulsionou o aumento das exportações no primeiro trimestre do presente ano.
“Com efeito, no período em referência, o valor das exportações de bens incrementou face ao período homólogo do ano anterior, em USD 724 milhões, dos quais USD 575 milhões são atribuídos aos grandes projectos, a reflectir o efeito combinado do aumento do volume e de preços das mercadorias no mercado internacional”, lê-se no documento.
De acordo com o relatório, os sectores que mais contribuíram no total das exportações foram o extractivo e o industrial, com destaque para o carvão mineral e o alumínio.
Ragendra de Sousa falava numa entrevista exclusiva que concedeu ao programa televisivo “O País Económico” exibido, ontem, na STV, onde assumiu que o papel do Governo em relação ao sector privado nacional deve ser de facilitador.
Mas, quando questionado se cumpriu essa missão, respondeu: “O papel de facilitador, eu penso que fiz bem, mas sempre com limitações. Para que as pessoas percebam, a taxa de juro é um custo de produção, passa para o produto. Foi um calcanhar de Aquiles para mim e será para outros. A taxa de juro passa para o preço e reduz o poder de compra”, explicou Ragendra.
Em relação ao tema da taxa de juro, Ragendra de Sousa diz que o Estado deve pensar bem se quer competir com o sector privado. E há um contexto para isso. É que, a cada ano que passa, os níveis de endividamento do Estado na banca nacional tendem a manter-se altos, facto que tem afectado as empresas.
Segundo o Banco de Moçambique, a dívida pública interna continua elevada. O endividamento público interno, excluindo os contratos de mútuo e de locação e as responsabilidades em mora, situa-se em 248,2 mil milhões de Meticais, um aumento de 29,4 mil milhões em relação a Dezembro de 2021.