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Os milhões que o Governo deve aos campeões

A cada segunda quinzena de Dezembro, fecha-se ao trânsito a avenida 24 de Julho, reforça-se o contingente policial, monta-se o estrado, estende-se o tapete vermelho à entrada da Assembleia da República e, ao ritmo de uma carregada salva de palmas, sobe-se ao púlpito para se falar do desporto moçambicano. As suas conquistas!

No informe sobre o Estado da Nação, descreve-se em alguns parágrafos as medalhas conquistadas pelos atletas moçambicanos em competições internacionais.

O Presidente da República enaltece quem, de medalha ao peito, faz arrepiar corações e subir as emoções dos moçambicanos com a entoação do hino “Pátria Amada” e o içar da bandeira nacional.

Uma glorificação aos feitos alcançados por atletas que galgaram patamares elevados, uma reclamação do papel do Governo neste desiderato através de assertivas político-desportivas.

Cerram os punhos os atletas, ficam na expectativa de receberem dinheiro à luz do Regulamento de Premiação Desportiva, um instrumento legal aprovado pelo Governo em 2007.

Governo tal que definiu a atribuição de valores monetários aos atletas e respectivos acompanhantes que conquistem medalhas em provas internacionais de carácter oficial. Mas o Executivo pontapeia, hoje, o dispositivo legal por si aprovado.

Faz ouvidos moucos às reclamações de atletas que, há cinco anos, não são premiados. Sobe de tom a indignação dos medalhados, a despeito de terem escrito uma carta ao Fundo de Promoção Desportiva (instituição subordinada à Secretaria de Estado de Desporto), a reclamarem o pagamento de um valor global de treze milhões, duzentos e dez mil Meticais.

Com os atletas nacionais a manterem-se nos lugares de pódio, mais claro se torna que o gráfico vai subir e os dígitos vão aumentar!

O prometido não está a ser cumprido! A narrativa do Governo é solucionar o problema o mais breve possível.

Os atletas sentem-se enganados, genuinamente; Desvalorizados; Menorizados. Afinal, é algo de direito. Do boxe ao atletismo. Do judo à vela e canoagem. Do futebol ao basquetebol. Da natação ao voleibol e tantas outras modalidades. É como se nada tivesse acontecido. Com tamanha naturalidade, quais verdadeiros obreiros das conquistas, os dirigentes apossam-se dos momentos de chegada dos atletas no Aeroporto Internacional de Maputo.

Promovem passeatas, recepções calorosas e sessões de fotografias de bradar aos céus. Tudo para alimentar as redes sociais e reclamar protagonismo. O bom senso não habita! Nem tão pouco.

A tudo isto se soma o patrocínio de pais e encarregados de educação para assegurar que atletas de algumas modalidades participem em provas internacionais.

E mesmo assim, com alto patrocínio dos portadores de microfones e gravadores, são os mais destacados na hora de falar das glórias.

Atropelam os protocolos, colocam-se na linha da frente, no tradicional momento de exibição de troféus à saída das aeronaves, e pousam para a posterioridade. Pode parecer normal os dirigentes saudarem e marcarem presença na recessão de atletas, quando estes regressam ao país. Sim, pode parecer mesmo normal. Contudo impõe-se que respeitem o espaço de quem efectivamente fez por merecer.

Até hoje, os Mambinhas, vencedores do Torneio COSAFA sub-20, aguardam a passeata prometida ao mais alto nível e estadia num dos paraísos turísticos de Moçambique.

Não basta minimizar os objectivos traçados pelas federações desportivas nacionais de simples participação em provas internacionais, desafiando-os a trazerem medalhas para o país. É preciso que haja coerência no discurso aliado ao cumprimento das promessas.

Dos mais velhos, os Mambas, já nem se fala. Os tão prometidos terrenos na agora apetecível região da KaTembe, pela qualificação ao Campeonato Africano das Nações de 1996, na África do Sul, continuam uma miragem.

Não podemos dar muito, mas podemos e devemos honrar os nossos compromissos!

Os dirigentes das federações desportivas têm, igualmente, as suas responsabilidades. Porque, embora reconhecendo que o Estado tem que desempenhar um papel central, não podem cair no erro habitual para ele transferir todas as responsabilidades.

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