José Monjane não só confirmou transferências de mais de um milhão de Meticais para cabazes de fim do ano, como também assume ter levantado mais de 10 milhões de Meticais e diz que esta verba se destinava ao adiantamento de pagamentos a mineiros. É que quando as empresas mineiras não canalizassem os 60% dos ordenados dos seus trabalhadores a Moçambique, a Direcção do Trabalho Migratório adiantava o valor, dada a aflição dos mineiros.
O interrogatório ao arguido José António Monjane esteve virado não só às acusações que pesam sobre si, mas também à confirmação de actos imputados aos co-arguidos Helena Taipo, Anastácia Zita, Pedro Taimo e o empresário De Sheng Zang. Das suas declarações, o arguido foi revelando factos que mostram como foi o esquema que desfalcou a Direcção do Trabalho Migratório em 113 milhões de Meticais.
Pelo segundo dia, sentou-se diante da juíza Evandra Uamusse o arguido José Monjane. À data dos factos, era chefe de repartição de Finanças na Direcção do Trabalho Migratório, por isso foi questionado sobre várias transferências, a começar pelas que têm a sua assinatura. Acompanhemos, a seguir o interrogatório, incluindo as perguntas da juíza.
Juíza Evandra Uamusse: Confirma que uma das rúbricas na solicitação de transferência de 200 mil MT, a 25 de Novembro de 2013 para Premier Group, destinada à compra de cabazes de fim de ano é sua?
Arguido José Monjane: Confirmo, é minha.
Juíza Evandra Uamusse: Quem autorizou a transferência?
Arguido José Monjane: Se não me falha a memória, foi autorizada pela ministra do Trabalho, Maria Helena Taipo.
Juíza Evandra Uamusse: E a rúbrica de transferência para Premier Group, no dia 27 de Novembro de 2014 no valor de 650 mil MT, também destinada à aquisição de cabazes é sua?
Arguido José Monjane: Sim, Meritíssima, é minha. Também foi autorizada pela ministra do Trabalho.
Juíza Evandra Uamusse: A DTM celebrou contrato com Premier Group para este fornecimento de cabazes?
Arguido José Monjane: Não celebrou, Meritíssima.
Juíza Evandra Uamusse: Recebeu voucher?
Arguido José Monjane: Recebi, Meritíssima.
Juíza Evandra Uamusse: Confirma que é sua rúbrica que consta da solicitação de transferência no valor de 188.250 MT a favor do supermercado July para a compra de cabazes de fim do ano.
Arguido José Monjane: Confirmo, mas aqui outros sectores também contribuíram e a solicitação foi feita pelo departamento dos Recursos Humanos.
Os cabazes, quer os adquiridos na Premier Group, quer no supermercado July, totalizam 1.038.250 Meticais.
Dos levantamentos, o arguido já tinha dito que tirou 200 mil Meticais do banco para passar ao co-arguido Sidónio dos Anjos, então chefe do gabinete da ministra do Trabalho. Mas há mais e eram necessários esclarecimentos.
Juíza Evandra Uamusse: A 24 de Março de 2014 levantou cheque no valor de 350 mil MT a partir da conta Juros. Quem emitiu o cheque?
Arguido José Monjane: Quem emitiu o cheque são as pessoas que assinaram.
Juíza Evandra Uamusse: Quem são?
Arguido José Monjane: Se a minha assinatura constar, então fui eu. Não posso responder por outras pessoas.
Juíza Evandra Uamusse: Para que se destinava o valor?
Arguido José Monjane: Já não me recordo meritíssima.
Juíza Evandra Uamusse: Consta dos autos que efectuou levantamento no valor de 3 milhões de MT a partir da conta Fundo de Maneio. Quem emitiu o cheque?
Arguido José Monjane: Fui um dos assinantes?
Juíza Evandra Uamusse: Qual era a finalidade?
Arguido José Monjane: Era para adiantar o pagamento diferido aos mineiros.
Juíza Evandra Uamusse: Consta dos autos que efectuou levantamento de cheque no valor de 3 milhões de MT a partir da conta Fundo de Maneio.
Arguido José Monjane: Também era para adiantar o pagamento diferido.
Juíza Evandra Uamusse: Consta dos autos que levantou cheque no valor de 1.800.000 MT a partir da conta Fundo de Maneio.
Arguido José Monjane: Meritíssima, o que me recordo desses valores era para adiantamento aos mineiros.
Juíza Evandra Uamusse: Consta também dos autos que levantou 2.213.000 MT da mesma conta. Também era para adiantamento aos mineiros?
Arguido José Monjane: Sim, foi. Mas, caso não tenha sido isso, podemos trazer os documentos que mostram qual era a finalidade. Alguns valores foram usados em outras despesas da direcção, com foco para a reinserção social dos ex-mineiros e seus dependentes.
Na verdade, estes levantamentos para os chamados pagamentos diferidos aos mineiros aconteciam, de acordo com a explicação do arguido, quando os 60% dos seus ordenados não fossem canalizados a tempo pelas empresas mineiras a Moçambique para pagar a estes trabalhadores. O valor de que se falou na sessão chegou a totalizar 10.013.000 MT.
Outro dado relevante divulgado aqui em tribunal é que a DTM transferiu 3.700.000 MT para a empresa Donna Tina Artes de Decorações de Interiores para o fornecimento de serviços de mobiliário e cortinas ao Gabinete do Mineiro. E quem é o responsável deste gabinete? É o arguido Pedro Taimo, marido da proprietária da empresa que ia mobilar este departamento.
Juíza Evandra Uamusse: Consta que a Mulher Investimentos solicitou a disponibilização de 500 mil Meticais em numerário para aquisição de material de construção e o valor foi depositado na conta da empresa Donna Tina Artes de Decorações de Interiores, cuja proprietária é Argentina Taimo, casada com o arguido Pedro Taimo em regime de comunhão de bens. Por que razão o valor foi depositado na conta da Donna Tina e não na Mulher e Investimentos?
Arguido José Monjane: O valor foi entregue em numerário. Não reconheço a conta da Donna Tina. O resto não posso precisar, Meritíssima.
O arguido confirmou também a compra de 50 bicicletas e o seu transporte da Yassime-Quelimane para Nampula, mesmo sem nenhum contrato com a Direcção do Trabalho Migratório e ainda a aquisição de motorizadas.
Falou também de almoço de confraternização aquando da despedida de um funcionário que ia à reforma, que custou 20 mil Meticais, autorizado pela então directora do Trabalho Migratório, Anastácia Zita, e o almoço para mineiros pela passagem de 1 de Maio, que custou 70 mil Meticais, e disse que estes aconteciam duas vezes ao ano, incluindo no fim do ano, quando representantes de trabalhadores das minas fossem saudar o Presidente da República.
E, uma vez mais, pela quantidade de informação detida pelo arguido, a sua audição foi estendida por mais um dia. Continuará a ser ouvido esta quarta-feira, devendo ser o Ministério Público e os advogados de defesa a colocar questões. Em mais uma alteração de calendário, depois do interrogatório desta quarta-feira, nova sessão fica marcada para terça-feira da próxima semana.