O novo modelo de descentralização pode, sem dúvidas, constituir uma péssima experiência para Moçambique, se tivermos em conta que a sua implementação inicia com o "partido único" por via dos resultados eleitorais do dia 15 de outubro de 2019.
De forma retumbante e asfixiante as eleições daquele ano, deram vitória ao partido Frelimo e o seu candidato presidencial, Filipe Nyusi.
A minha opinião não se vai guiar na legitimidade ou não das eleições, se foram ou não livre, justas e transparente, mas sim, no modelo que pode constituir um desafio para Moçambique.
Seria uma experiência contrária, no meu entender, se o processo de descentralização iniciasse com verdadeira partilha de poder, onde a Frelimo e os partidos da oposição, por exemplo, fizessem parte da governação das províncias.
Ora, se a Frelimo não estiver atenta, este facto pode provocar uma vaga de opositores dentro do próprio partido tendo em conta que, ser governador sempre foi visto, não só dentro da Frelimo, como também no seio do povo, um verdadeiro símbolo de poder provincial.
Ora, ser um governador, embora tenha passado por vias de lista partidária dentro da Assembleia Provincial, é preciso lembrar que foi o mesmo que durante os 45 dias de campanha eleitoral esteve ferverosamente com os seus correligionários a pedir voto para o partido e seu candidato presidencial.
Acredito que poderá ser no mínimo doloroso, não só para o timoneiro, como também para o povo, ver um governador por si "eleito" a ser tutelado pela figura de Secretário de Estado nomeado por confiança do Chefe de Estado. Ou seja, a questão que não quer calar manda o seguinte: O modelo de descentralização que já está a vigorar privilegia mais a decisão do povo que elegeu o seu governador ou privilegia a figura do Secretário de Estado, o nomeado?
O artigo 9 da lei 5/2019 de 31 de Maio sobre mecanismo de tutela, no seu número um refere que "O órgão com poderes tutelares pode realizar inspeções, auditorias, inquéritos ou sindicâncias, aos órgãos de governação descentralizada provincial e das Autarquias Locais, sobre os actos administrativos, actos de natureza financeira e patrimonial por estas praticadas".
Se o Secretário de Estado, na presente lei, pode tutelar governadores eleitos e por meio disso questionar a legalidade e o mérito das suas decisões, fica claro que o novo modelo de descentralização é oposto à visão de Montesquieu, ou seja fere com a vontade popular.
Estamos perante uma situação em que aquele que o povo depositou confiança nas urnas para exercer a governação de província tem menos poder que aquele que foi nomeado.
O legislador ao elaborar a lei de descentralização teve em conta a vontade popular? Será que o povo é, na presente lei, o epicentro do poder? Em fim, são várias as questões que ficam no ar em volta da nova lei de descentralização e, oxalá que nós os moçambicanos, reflictamos sobre para onde queremos ir.