O Myanmar (antiga Birmânia), a Tailândia e a China iniciaram, esta quinta-feira, uma operação de grande envergadura para repatriar centenas de chineses, que foram resgatados a partir de centros de “burla online”, onde eram alegadamente mantidos em cativeiro.
O primeiro grupo, composto por dezenas de pessoas, embarcou num voo operado pela China Southern Airlines, que descolou do aeroporto tailandês de Mae Sot (noroeste) por volta das 11h30, com destino a Xishuangbanna (sul da China).
Atravessaram a fronteira ao início da manhã sob forte segurança, escondendo os seus rostos da imprensa. O plano é repatriar 200 chineses, durante o dia de hoje, de acordo com as autoridades tailandesas.
Estão previstos cerca de 16 voos até sábado, para cerca de 600 pessoas. O repatriamento de todas as pessoas em causa poderá demorar semanas e não foram anunciados pormenores sobre o que lhes irá acontecer na China.
O primeiro-ministro tailandês, Paetongtarn Shinawatra, disse, na quarta-feira, que cerca de sete mil pessoas estavam à espera de serem libertadas, enquanto um representante da Força de Guarda Fronteiriça do Estado de Karen (BGF), uma milícia étnica que actua no Myanmar, estimou o número em 10 mil.
Esta operação surge após meses de protestos da China, uma vez que as vítimas são maioritariamente chinesas: empregadas à força em centros que realizam burlas pela Internet.
“Duzentos cidadãos chineses envolvidos em jogos de azar ‘online’, fraudes nas telecomunicações e outros crimes foram entregues, esta manhã, pela Tailândia, de acordo com os procedimentos legais, num espírito de humanidade e amizade entre os países”, declarou a junta do Myanmar, citada por Lusa.
Mae Sot fica apenas a 10 quilómetros, em linha reta, de Shwe Kokko, uma cidade do Myanmar que construiu a sua prosperidade com base numa variedade de actividades de tráfico, com impunidade quase total.
Os gigantescos complexos onde se executam actividades fraudulentas abundam nas regiões fronteiriças do Myanmar, consideradas zonas sem lei, devido à guerra civil que abateu o país desde o golpe de Estado de Fevereiro de 2021.
Segundo os especialistas, as redes mafiosas recorrem à força para empregar mão-de-obra predominantemente chinesa, na sua maioria através de traficantes de seres humanos, para executar fraudes que geram milhares de milhões de dólares por ano.
Nos últimos meses, Pequim intensificou a pressão sobre a junta do Myanmar, da qual é um dos principais fornecedores de armas, para que ponha fim a estas atividades. De acordo com um relatório das Nações Unidas publicado em 2023, os centros de fraude empregam pelo menos 120 mil pessoas no Myanmar.
O mesmo relatório da conta de que muitas das vítimas foram sujeitas a tortura, detenção arbitrária, violência sexual e trabalho forçado. Muitos trabalhadores dizem que foram atraídos ou enganados por promessas de empregos bem remunerados, apenas para serem mantidos em cativeiro, pois os seus passaportes foram confiscados.
No início de Fevereiro, um outro grupo de milícias do Myanmar entregou 260 alegadas vítimas de uma dúzia de países, incluindo as Filipinas, Etiópia, Brasil e Nepal, às autoridades tailandesas.
Muitas delas apresentavam sinais de violência física, incluindo uma mulher que tinha enormes hematomas no braço e na coxa e que disse ter sido eletrocutada.
Ainda em Fevereiro, a Tailândia cortou o fornecimento de eletricidade a várias regiões fronteiriças do Myanmar, incluindo Shwe Kokko, numa tentativa de travar o aumento das atividades ilegais.
O reino quer dar garantias de segurança aos visitantes chineses, que são cruciais para o seu setor turístico. Os receios dos chineses aumentaram com o rapto, em Banguecoque, de um ator chinês, que foi levado à força para um centro de fraude no Myanmar, antes de ser libertado no início de janeiro.