A edilidade da Matola diz que a falta de dinheiro faz com que a sinalização nas estradas seja colocada em segundo plano, sendo primordial a construção de mais vias. Tendo razão ou não, o facto é que a situação contribui para a ocorrência de acidentes, que provocam mortes de peões, principalmente por atropelamento.
Maria Mabutane foi vítima de atropelamento quando tinha 18 anos, em 1996. 26 anos depois, ela ainda se imagina de sapato alto todos os dias. Mas isso nunca mais será possível, porque, para andar, precisa de uma bota ortopédica.
“Eu estava a atravessar a estrada quando um camião me atropelou e desmaiei de imediato. Levaram-me ao hospital onde fiquei um mês em coma e mais três meses internada. Quando despertei, os médicos disseram que fraturei a coluna e que ia precisar de usar uma bota ortopédica. Fiquei triste e chorava todos os dias”, recorda.
A bota que Maria usa deve ser trocada de três em três meses e custa 1800 Meticais. Sem poder trabalhar e com dois filhos por sustentar, a nossa entrevistada depende da ajuda dos seus pais para quase tudo.
“Tenho dois filhos – o menino está no ensino primário e a menina, a mais velha, já terminou o ensino secundário. Mas não tenho como custear um curso superior para ela. Quanto à alimentação, costumamos ir à casa dos meus pais para passar as refeições”, contou Maria Mabutane.
A história de Maria é apenas um exemplo do perigo que há nas estradas nacionais. Só no primeiro trimestre deste ano, 41 pessoas morreram vítimas de acidente de viação na Província de Maputo e, deste número, 13 foram por atropelamento.
“Tivemos uma subida do índice de acidentes e suas consequências, isto porque, durante o primeiro trimestre deste ano, registamos 39 casos de acidentes de viação contra 21 casos em igual período do ano passado, que provocaram 41 óbitos contra 28 do ano passado, uma subida de 13 oitos. No que diz respeito à tipicidade dos acidentes, tivemos, em primeiro lugar, os atropelamentos, com 13 casos”, detalhou o porta-voz da Polícia de Trânsito, Rodrigues Tchabana.
A Polícia de Trânsito aponta a má travessia de peões como a principal causa dos atropelamentos, o que se agrava quando a estrada não está devidamente sinalizada.
“A falta de sinalização contribui, em grande medida, para os acidentes de viação. Em algumas zonas, a sinalização perdeu a qualidade, já não está em boas condições. O peão não se apercebe se ali tem uma passadeira ou não ou o condutor não sabe a que velocidade deve andar”, explicou Tchabana.
Na cidade da Matola, algumas estradas não estão sinalizadas, sendo sete nas estatísticas das autoridades policiais, mas acredita-se haver mais.
A estrada que liga os bairros Zona Verde e Khongolote é disso exemplo. A via é estreita, com curvas e contracurvas, o que tem originado vários acidentes. “Isto não é alcatrão, é pedra cimento e área. Camiões e carros de vários tipos passam por aqui à alta velocidade, por isso as lombas já não aguentam”, explicou um dos moradores.
Em 2019, depois de três crianças, sendo duas da mesma família, terem sido atropeladas, moradores uniram-se para construir lombas e pôr fim aos recorrentes acidentes naquela via. Augusto Benedito, que fez parte da equipa de moradores que colocou a mão à massa, lamenta o silêncio do Município da Matola.
“Um mês depois de construir lombas, vieram para dizer que iam demolir estas para construir outras com material próprio, mas, até hoje, nada dizem”, disse.
As poucas placas que existem na via que liga Zona Verde a Khongolote estão a perder cor e clamam por reabilitação. Noutro ponto da via, parte da vedação de uma agência funerária foi demolida quando um carro despistou e embateu.
Segundo a Polícia de Trânsito, em locais próximos a escolas, os sinais devem ser conjugados, ou seja, as passadeiras devem ser acompanhadas de placas que indicam a presença de estabelecimentos de ensino. Mas não é o que se verifica tanto na via Zona Verde – Khongolote, como naquela que liga Zimpeto a Muhalazi. Há passadeira, mas não há nenhuma placa, o que coloca os alunos em risco.
Shelcia Manhiça, que tem nove anos e frequenta a quarta classe, presenciou o atropelamento de uma colega. Ainda traumatizada, a criança relata que “ela estava a atravessar a estrada e não viu que o carro vinha pela sua esquerda. O carro bateu nela, mas o motorista parou e levou-a ao hospital”.
No caso da colega de Shelcia, o acidente não foi mortal, mas há relatos de mortes naquela via. As autoridades do bairro dizem que já relataram o caso, porém não obtiveram nenhuma resposta, por isso pedem a quem de direito a construção de lombas em locais próximos a escolas.
“Pedimos a construção de lombas, porque temos escolas ao longo da estrada e placas que indicam a redução de velocidade”, clamou Augostinho Manhiça.
A sinalização, os passeios e as valas de drenagem fazem ou deviam fazer parte de um projecto de construção de uma estrada, mas, no Município da Matola, muitas são entregues sem uma nem outra, pior a sinalização. A edilidade reconhece o problema, mas diz que não tem dinheiro para sinalizar estradas.
“Pode ser que, em alguns pontos, a sinalização esteja desgastada e é preciso renovar. O grande desafio que temos é a mobilização de recursos. Se os tivéssemos, se calhar nem estaríamos aqui a falar de sinalização”, justificou o vereador para a Área de Infra-estruturas no Conselho Municipal da Cidade da Matola, Firmino Guambe,tendodepois falado das prioridades municipais.
“Em algum momento, temos que olhar para a questão do custo e benefício. Há zonas onde, quando chove, mesmo tendo viatura, as pessoas não conseguem sair de casa. Qual seria o critério para definir prioridades quando o dinheiro que se tem não permite avançar com todas as acções numa só vez? É uma questão de prioridades em função da disponibilidade financeira”, palavras que se resumem em dizer que a sinalização não é tão prioritária quanto à construção de estradas.
De acordo com os dados da PRM, os acidentes rodoviários mais frequentes são do tipo atropelamento, choque entre carros, despiste e capotamento.
De acordo com um estudo feito pela Associação Moçambicana de Assistência às Vítimas de Acidentes de Viação (AMVIRO), só no primeiro trimestre deste ano, em cada acidente, uma pessoa morreu.
A nível mundial, os traumatismos por acidentes rodoviários são responsáveis por, aproximadamente, 13 milhões de mortes e custam aos países pobres até cerca de 5% do PIB, refere o relatório da OMS sobre a segurança em África.