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Mia Couto diz que houve desleixo em relação aos raptos

Foto: O País

Mia Couto sente que houve desleixo do Governo na resposta aos raptos. Em “Grande Entrevista” à STV, o escritor classifica como vergonhosas as promessas não cumpridas de apresentar publicamente os mandantes dos crimes. Considera, ainda, que se perdeu a vergonha de mostrar riqueza num país com muita pobreza.

Um dos gigantes da literatura de língua portuguesa, António Emílio Leite Couto, foi o convidado desta semana do programa Grande Entrevista, da STV.

Em 60 minutos, o escritor, vencedor da 25ª edição do Prémio Camões, em 2013, partilhou o seu pensamento sobre diferentes temas da actualidade, entre os quais os raptos. O fenómeno ganhou contornos alarmantes nos últimos anos, com alguns empresários a abandonarem o país por temerem ser raptados. Ademais, há relatos de vítimas que chegaram a morrer em cativeiros.

“Acho que houve um certo desleixo, exactamente porque parece que é uma coisa que está ali e está confinada a um certo tipo de comunidade, mas é uma vergonha, no sentido de como é que a reacção parece pouco displicente. Não há promessa de que se vai exibir os mandantes. Essa promessa vai como o resto: apanha-se aquilo que é peixe miúdo, mas o peixe graúdo não é visível”, disse Mia Couto.

A visão crítica de Mia Couto estende-se para a governação e os governantes em Moçambique.

“É preciso que a governação se faça pelo exemplo e que os dirigentes deste país, através da sua própria vida e vivência pública, mostrem que são servidores e que optaram por uma vida, não diria de sacrifício, mas se pedem sacrifício aos outros eles devem ser os primeiros.”

Couto fala ainda sobre pobreza e desigualdades e condena a sociedade que considera que tem cada vez menos empatia com aqueles que pouco ou nada tem. “Parece que se perdeu a vergonha de mostrar que eu sou muito rico num país de gente muito pobre e essa minha riqueza nem sempre terá vindo… Desde que me lembre, eu trabalho, e não tenho possibilidades dessa riqueza. Se a tivesse, eu gostaria de ter. Teria um certo pudor em exibir de maneira como se exibe. E criou-se a ideia de que só se é cidadão se for assim, se for rico”, criticou o autor de “Vozes Anoitecidas”, livro de contos com que se estreou na ficção, a que se sucedeu “Cada Homem é uma Raça”, “Estórias Abensonhadas”, “Contos do Nascer da Terra”, entre outras obras.

Homem da literatura, da escrita e das palavras, Mia Couto diz também, nesta entrevista, o que pensa sobre os problemas da educação.
Aliás, quando questionado sobre o que lhe vai na mente quando se fala da educação, o autor de uma vasta obra ficcional caracterizada pela inovação estilística e a profunda humanidade, não hesitou em dizer: “Vem-me a palavra deseducação, porque eu acho que o problema da educação não é só a falta de qualidade deste modelo que é patente e enorme, quer dizer, talvez o factor que mais compromete o nosso futuro é a má qualidade da educação”, frisou.

Finanças públicas, situação da oposição e a vida literária de Mia Couto foram outros temas abordados na entrevista.

Nascido na Beira (Moçambique) em 1955 , Mia Couto também escreveu peças de teatro e é actualmente o autor mais lido dos países de língua oficial portuguesa em África.

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