Por: Sumbi Sê
Ao propor-me a escrever sobre a exposição A Brisa do Nada, não me comprometo a responder à pergunta que encabeça o texto. A expressão artística supera a categorização de obras em escalas menores, médias ou altas. A intenção do texto é entreabrir uma portada de um lugar ao qual o público nunca tem acesso, porque a produção artística realiza-se em espaço privado, fechado e discreto. Pelo menos é isso que se passa com Lica Sebastião. Nesse espaço desconhecido aos outros, têm privilégio a obstinação, o desejo de criar o belo, a idealização mas também a incerteza, o medo e a teima em fazer bem, em comunicar, em ser a si próprio.
Apesar desse ambiente de contraste entre o fazer, desejar, idealizar e a incerteza, medo e a procura de si mesma, podem ser reconhecidas as dimensões da criação desta artista. Uns diriam que a presença do traço feminino é notório quiçá pelas imagens e rostos. Eu diria que se associa a artista a um traço restritivo e enganador. Há artistas que procuram soluções e saídas para os materiais que manipulam numa busca incessante de equilíbrio de cores, de voz ou vozes ou de qualquer outra coisa que os defina. Isso é a arte e não o feminino.
Outros podem constatar o esforço empreendido em observar em torno e a visualização de formas, de contornos, de objectos que podem ser o ponto de partida para a criação artística. Sim e isso é um desafio que não se esgota. Os artefactos, comprados ou recolhidos por aí, requerem a aplicação de diferentes técnicas e nem sempre a primeira ideia é bem-sucedida. Lica Sebastião fê-lo em Metal, cartão e madeira (2016), Gineceu1 (2019), Metamorphósis ( 2020), Gineceu2 (2022).
Finalmente, a carga afectiva, que só ao artista diz respeito, individualmente, e influenciado pelo ambiente. Percebe-se a história pessoal da artista nos motivos florais, o uso do lápis em contextos inesperados na tentativa de se surpreender, a escolha recorrente das mesmas cores como uma obsessão. Esta talvez seja a característica que mais salvaguarda a criação da artista.
As três vertentes citadas não se podem desligar, pois a sua criação é um movimento que começa mas a artista não sabe exactamente quando e como termina. O primeiro passo começa com qualquer objecto e, a seguir, o desenho, a pintura “escrevem” uma narrativa experimental. Por isso, cada peça é uma experiência e cada experiência é diferente da anterior.
E isto é arte?
A própria definição de arte não se fecha em uma só enunciação. Varia ao longo do tempo e coexiste com outras concepções numa dada época. A actualidade é receptiva da diversidade. A mimesis e reprodução do que existe são cultivadas ao mais ínfimo pormenor, a imaginação e as emoções desaguam o abstracionismo. Pode isto ser apenas argumento para justificar coerência e sentido à arte de Lica Sebastião.
Isso é arte? Uma pergunta bem pode ser a própria resposta.