Causou, há dias, estupefação e indignação nas inflamatórias redes sociais a imagem de um salão de beleza instalado numa das bilheteiras do Estádio Nacional do Zimpeto, infra-estrutura desportiva cuja licitação para a sua construção foi ganha por uma empresa chinesa e as obras estavam avaliadas em USD 57 milhões. Para mim, nada para arrepiar os cabelos.
Porquanto, em artigos publicados no “O País” entre 2011 e 2014, eu e o Lázaro Mabunda (de)mostrámos com factos e números o quão as infra-estruturas construídas aquando dos Jogos Africanos Maputo-2011 transformar-se-iam em elefantes brancos por falta de ideias claras sobre a sua gestão, manutenção e capacidade de gerar receitas.
Esta série de artigos intitulada “O outro lado dos Jogos Africanos”, aliás, valeu-me o prémio Saíde Omar de melhor reportagem desportiva em 2014. E alguma “mola”, claro.
A transformação de uma das bilheteiras do ENZ em salão de beleza é, na verdade, a demonstração de que estamos “anos-luz” de uma gestão inovadora e criativa de infra-estruturas.
Os dirigentes desportivos são órfãos de ideias sobre processos de rentabilização.
Foi, e está claro, que esta foi uma das medidas tomadas pelos gestores do ENZ na perspectiva de gerar receitas para manutenção do complexo desportivo do Zimpeto. Pura realidade, tão falta de alma com…criatividade. Tal como aconteceu no passado, quando se arrendou uma das áreas para a exploração de um bar que veio a ser afectado, em 2016, com a queda do murro da piscina Olímpica.
Na senda da falta de ideias, veio ao de cima a tragicomédia testemunhada pelo presidente da República que, quando visitou o Complexo Desportivo do Zimpeto, em Fevereiro de 2017, ficou a saber que a pessoa que havia arrendado o espaço no qual estava a ser explorado um bar desaparecera com as chaves!
Não há, e não sei se já houve, uma ideia clara de que como rentabilizar a piscina Olímpica. Gerida directamente pelo Fundo de Promoção Desportiva após os X Jogos Africanos Maputo 2011 e com pouca actividade desportiva até 2013, o espaço passou depois para a gestão da Federação Moçambicana de Natação com o objectivo de se transformar em centro de excelência e de alto rendimento no quadro de parcerias com África do Sul e Brasil. Nunca chegou a ser, tal como avançara a Federação Moçambicana de Natação.
Pelo contrário! Transformou-se, isso sim, num viveiro de sapos que encontraram nas águas turvas o seu “habitat” após as descargas atmosféricas que, em 2014, fizeram com que as águas da piscina Olímpica invadissem a zona de maquinaria e das limpezas. Os danos foram avultados. Não estávamos preparados para um cenário de queda de precipitação acima de normal.
Facto: o sistema instalado no complexo desportivo do Zimpeto, dado o alto teor tecnológico, não se compadece com as oscilações e cortes constantes de energia.
O Estádio Nacional do Zimpeto, esse, esteve encerrado perto de um ano para dar lugar a substituição da relva natural implantada aquando da sua construção em 2010. O estado da relva já se apresentava degradado- acolhia jogos do Moçambola e da selecção nacional-, mas piorou com os estragos provocados durante a celebração do jubileu das Forças Armadas de Moçambique. As obras custaram, ao Estado, cinco milhões de meticais, na altura. Não se materializou, no entanto, o projecto de colocação de relva nos campos de treinos e de aquecimento, o que podia criar menos desgaste na relva do campo principal. Os sistemas sonoros e eléctrico chegaram a operar com falhas. O arrendamento dos espaços no ENZ para casamentos, baptizados e outros eventos revela-se desastrosa em termos de receitas para manutenção da infra-estrutura. Restava, apenas, uma ideia brilhante: instalar um cabeleireiro! Aos amantes de desporto, só lhes resta é chorar “mamawê”! Senão mesmo contemplarem-se com manicure e uma boa juba! Empreendimentos da terra (sobre)vivem de gentes da terra!