Não há espetáculo, não há concertos, não há shows e muito menos casamentos. Moçambique está em Estado de Emergência devido ao novo coronavírus e está interditada a realização de qualquer tipo de evento cultural ou desportivo. E os impactos já são visíveis na vida de quem tem na cultura a fonte de rendimento.
O país está em Estado de Emergência. As pessoas circulam com restrições. Os mercados têm horários de funcionamento. Os cultos estão suspensos. Teatros, cinemas, espetáculos e concertos estão cancelados. Aliás, a sua realização está proibida. O novo coronavírus está a deixar impactos negativos na música e na vida de quem tem nela (a música) a fonte de rendimento.
Sem distinção, a pandemia COVID-19 afectou, negativamente, o estilo musical da antiga e nova geração. Conhecido no mundo da música como Duas Caras, o rapper sempre deixou transparecer, ainda que de leve, que vive disto.
“Uma outra actividade que também faço está afectada na medida em que não posso viajar, pois tem a ver com saídas internacionais então não posso fazer. Mas a música, com certeza, era uma das principais, mas vamos ver no que é que isso vai dar”, sublinhou o rapper Duas Caras.
Enquanto se espera por dias melhores, Duas aproveita o período de distanciamento social para manter a forma e escrever algumas letras até porque dias melhores estão por vir. “Não estou desesperado porque eu acho que é uma coisa que vai passar, mas tenho aproveitado esse tempo para continuar a trabalhar”.
Trabalho, trabalho e mais trabalho só que a partir de casa para evitar a contaminação pelo novo coronavírus é o mesmo que faz o músico “mais velho” Wazimbo depois que a pandemia ter condicionado a realização de oito concertos que tinha pela frente.
“Eu vivo do meu dia-a-dia. Daí que o pouco que havia é aquilo que fui aguentando até neste momento. Doravante só Deus é que sabe o que vai acontecer. Vamos desenrascando aqui e acolá”.
E é diante do mesmo Deus que Wazimbo pede união de todos para que o momento difícil que o mundo está a passar passe o mais cedo possível “porque se isto continuar assim, as nossas reservas vão esgotar e aí virão dias de fome, desemprego e criminalidade”.
Falando em reservas, António Marcos ainda tem o mínimo para sobreviver…o mínimo mesmo e receia que se a situação piore nos próximos dias e não tenha como alimentar a si e aos seus netos.
“Eu tinha três festivais gigantes que, de repente, cancelaram. Eu vivo da música. Tinha tantos outros trabalhos que não preciso aqui especificar”, lamentou o músico António Marcos.
O que o homem da boina e luvas brancas não sabe especificar é o que fará nos próximos dias para sobreviver, mas consertar sapatos parece ser a alternativa mais viável. “Tento me recompor para poder escolher o que devo fazer. Não posso ir para madeira nem para carpintaria. Mas estou a considerar a possibilidade de abrir uma sapataria”, avançou, António Marcos.
A pandemia do novo coronavírus encontrou a todos em contramão, daí ser o momento de repensar numa fonte alternativa em caso de próximas crises. “Isso chama-nos à atenção para necessidade de, muito cedo, enquanto trabalharmos, saber fazer poupança. O músico não tem um salário fixo. Há fins-de-semana que ganha mais, outros (fins-de-semana) ganha menos. O mais importante é que ele defina cada mês qual é o seu salário e deposite uma parte como poupança”, aconselhou Aniano Tamele.
Segundo Tamele, o Governo não tem condições da subsidiar todos os sectores que poderão ser devastados pela pandemia da COVID-19 e muitos menos a cultura, “ Melhorar as políticas culturais, “impondo-se que os músicos tenham algum seguro privado para situações calamitosas como estas”.
Não obstante os prejuízos que os artistas tem somado devido à COVID-19, o mais importante é preservar a saúde, aproveitando os dias de distanciamento social para manter a forma.
“Estamos a perder dinheiro, mas acima de questões financeiras está a nossa saúde pois ela (a saúde) é a nossa vida. Daí que é importante cumprir todas as medidas preventivas”, afirmou o rapper Flash Ency.
E cumprir com as recomendações das autoridades da saúde pode salvar a nossa vida e da dos demais, sobretudo “tendo fé no pensamento, tornando-se o soldado deste movimento, cumprindo com as normas do Estado de Emergência, ficar em casa e prevenir-se desse vírus”, aconselhou Flash Ency.
Além da música, os efeitos desastrosos da COVID-19 são indisfarçáveis nos salões de festas e casamentos. Cadeiras dos noivos, padrinhos e convidados vazias…na pista, nenhum movimento de garçons para servir os presentes…já lá vão dois meses que o complexo Palhota não conseguiu esconder os seus clientes da COVID-19.
“Tínhamos casamentos, seminários e foram cancelados. Desde o mês de março e agora estamos a caminho de Junho não temos nenhum evento. Isso deve dar uma estimativa de, mais ou menos, seis a sete milhões de meticais”, revelou Rosa Issufo, gestora do Complexo Palhota.
A Palhota ainda não despediu seus trabalhadores, isso porque a parte da acomodação ainda tem alguns clientes. “É só ter fé, mantermos a esperança. Temos a parte da acomodação que estamos ainda a 80% em termos de cancelamento, então isso vai permitir a sobrevivência da empresa neste momento”, referiu Rosa Issufo, com um tom carregado de suspiro de desespero.
E num momento em que os casos positivos da pandemia COVID-19 nem a minha casa, ou seja, Kaya Kwanga, é um local seguro para realizar qualquer tipo de evento. Casamento, nem pensar.
“Em termos de festas estamos a 0% de funcionamento. Infelizmente aquilo que o decreto prevê, não se pode mais nenhuma festa”, deplorou Jaime Bila, gerente do complexo residencial Kaya Kwanga.
Ainda que nada esteja a funcionar como dever ser, os Dois Oceanos continuar a fazer “flutuar” os seus serviços, mas também a partir de casa. “Estamos a usar instagram para fazer lives, alguns vídeos, onde as pessoas possam pagar um valor para os cursos e teremos algumas sessões grátis porque numa altura em que as pessoas não estão a trabalhar e por isso não há rendimentos. Então temos que ajudar de alguma forma” explicou Giovanni Paolo
E uma das formas de ajudar em tempos de distanciamento social, é montando um escritório em casa. “O cliente tem que, primeiro, dizer que tipo de trabalho faz ou serviço presta. Nós pegamos a informação e nós montamos o cenário” disse Paolo da Dois Oceanos.
Mas nem com esse ambiente, os promotores de eventos e espetáculos conseguem trabalhar. Os promotores de espetáculos falam dos prejuízos acumulados por conta da pandemia. “Nós temos uma plataforma que é o Moments of Jazz que, anualmente, faz dois concertos, um no primeiro semestre e outro no segundo, mas fomos obrigados a cancelar e ainda não temos datas porque não se vislumbra uma solução a curto prazo”, lamentou Belmiro Quive, promotor de eventos.