O ministro da Saúde exige mais intervenção dos pais e encarregados de educação no combate ao consumo de drogas por parte de adolescentes e jovens. Armindo Tiago falava durante as celebrações do Dia Internacional contra Abuso de Drogas e Tráfico Ilícito, assinalado ontem.
“Voltar a drogar-me não quero mais, porque aquilo que a droga me mostrou não quero para mim”.
É o sentimento de quem viveu 16 anos a depender de drogas. Melito Dimas experimentou-as quando tinha 14 anos de idade. Ele conta que já conheceu o mundo obscuro, mostrado por aqueles que chamou de “falsos amigos”.
Desde que iniciou a sua “empreitada”, já fumou, tomou e até injectou tipologias diversas de estupefacientes, cada um em função da necessidade, do desejo e do nível de dependência, mas o mais prejudicial: “quanto mais amizades ia conhecendo no mundo das drogas, novas drogas conhecia. Fui subindo para heroína, mas chegou um tempo em que aquela droga perdeu qualidade. Foi então que conheci o hiwhite e, depois, o thai, que não tinha boa qualidade, mas disseram-me que, injectado, dava mais ‘paulada’, por isso o experimentei”, Melito Dimas.
Dimas contou que “cheguei até a ficar sem veias por onde injectar a droga, passando já a injectá-la nos tendões – partes impróprias –, mas, por causa da ressaca, já não tinha controlo. Injectava-a até no pescoço”.
Nessa sua trajetória, a nossa fonte, um exemplo de superação, diz que perdeu família, amigos, escola e teve que abandonar a casa, pois, para alimentar o vício, tinha que vender alguns artigos da casa dos pais, mas “graças à ajuda de amigos e de algumas organizações, estou limpo há mais de um ano”.
Em cada história contada por um antigo toxicodependente, a influência de amigos tem sido a principal causa para o consumo de drogas.
“Aqueles amigos que te convidam para coisas aparentemente boas não são teus amigos de verdade, por isso eu apelo aos alunos, adolescentes e jovens para que nunca experimentem algo de que se vão arrepender amanhã”, disse Rodolfo João, antigo consumidor de drogas, que está “limpo” há mais de quatro anos, depois de 17 anos de toxicodependência.
Para chamar atenção dos mais novos para a necessidade de se manterem longe das drogas, a Escola Secundária Francisco Manyanga acolheu, sexta-feira última, as celebrações centrais do Dia Internacional contra Abuso de Drogas e Tráfico Ilícito.
Os adolescentes dão nota positiva à iniciativa, pois, tal como Philip Sidney, adolescente e aluno do ensino secundário, há muitos estudantes que se sentem ameaçados pelos colegas, que, depois de consumirem drogas, mudam de postura e viram marginais.
“Aqui, na escola, bem como noutras [instituições de ensino], há cenários de roubos de celulares, lanche, ameaças a colegas, o que não nos deixa à vontade”, disse o aluno.
Durante o evento, o representante da Organização das Nações Unidas contra Drogas e Crime (ONUDC) disse que a COVID-19 agudizou o consumo de drogas no mundo e Moçambique não foi excepção.
“Os conflitos e catástrofes climáticos e a pobreza são, naturalmente, terreno fértil para o consumo de drogas. A COVID-19 veio agudizar ainda mais estas vulnerabilidades”, disse Mário Teixeira, em representação à ONUDC
São estas e outras vulnerabilidades que contribuíram para o aumento do número de adolescentes que se perdem no mundo das drogas, conforme informou o Ministro da Saúde.
“A prevalência do consumo de droga e outras substâncias psicoactivas é mais expressiva entre os homens e no grupo etário de 21-30 anos de idade, e menos na população adulta com mais de 40 anos. No nosso país, no entanto, temos vindo a notar, com muita preocupação, que a idade de início do consumo de drogas tem estado a baixar, principalmente, do consumo de cannabis sativa, vulgo soruma”.
Por outro lado, segundo o Governo, o consumo de drogas e o abuso do álcool e do tabaco contribuem para o aumento de doenças infectocontagiosas, tais como HIV/SIDA, hepatites B e C, Tuberculose e a COVID-19.
Aliados ao consumo de estupefacientes, vêm a criminalidade, os acidentes, o fracasso escolar, a gravidez indesejada, as doenças sexualmente transmissíveis.
Para Armindo Tiago, há pais que não cumprem cabalmente o seu papel para o combate ao mal nos adolescentes, por isso chamou atenção: “Gostaríamos de apelar aos pais e encarregados de educação para prestarem mais acompanhamento aos nossos adolescentes e jovens, pois a prevenção contra o consumo de substâncias psicoativas começa em casa. Assim, criamos uma aliança de esforços com a escola na luta contra este mal”.
Depois de fazer um apelo aos encarregados de educação, o ministro da Saúde apelou a toda a nação moçambicana para o combate às drogas.
“Mantemos o apelo que fizemos no ano passado, no sentido de todos os moçambicanos redobrarem esforços para impedir o acesso fácil às drogas, bebidas alcoólicas e tabaco, a partir de casa”.
Este ano, o Dia Internacional contra Abuso de Drogas e Tráfico Ilícito é subordinado ao lema Desafios da Prevenção e Combate à Droga, em Momentos de Crises Humanitárias e Sanitárias.