Cantora lírica moçambicana regressou aos palcos, depois de enfrentar dias difíceis durante o confinamento, em Espanha, onde vive.
Mariana Carrilho vive há 11 anos no estrangeiro. Ao fim de uma década, a cantora lírica passou, nos últimos meses, por grandes provações em relação à sua carreira musical, pois, com o confinamento imposto pela COVID-19, em Espanha, não só esteve desempregada como teve de suportar ficar longe do palco e do público.
Depois de dois concertos suspensos, a artista moçambicana voltou a sentir a emoção de estar no palco no dia 27 de Junho. O musical com Gerard Mejías (Guitarra) e Laura Elena López (Soprano convidada) foi no Casino de Sant Andreu de la Barca, em Barcelona. Para a mezzo-soprano, o espectáculo que aconteceu num terraço, em condições não ideais para um reportório clássico com guitarra, foi… “uma sensação muito boa voltar ao palco, com público a desfrutar do momento. Foi uma volta de uma maneira muito curiosa. Regressamos à expressão… O que são as artes sem esse contacto com o público? O que significa dar um concerto se este concerto não tem público? A energia do público é importante e foi muito positiva no meu regresso ao palco”.
O concerto no Casino de Sant Andreu de la Barca, até aqui, é o único de Mariana Carrilho neste contexto de COVID-19. Também por isso especial numa carreira no estrangeiro que, afinal, é exigente: “Muitas vezes parece um investimento sem retorno esta carreira fora do meu país. É complicado. Não é um mar de rosas, não vou estar aqui a mentir. Não é fácil, mas as experiências que vou acumulando com isso vão compensado, de certa forma, esse investimento. Eu sei que vai haver esse retorno do investimento que estou a fazer, porque confio no meu trabalho e nas circunstancias que me vão ajudar, de alguma maneira. Além disso, eu tenho o grande privilégio de contar com o apoio da minha família. Isso é que me dá forças para continuar”.
Durante o confinamento, a cantora lírica se perguntou se deveria seguir com a sua carreira. Nessa altura, já não se tratava de querer lutar por uma carreira artística. A questão era: “será que eu posso? A pessoa já tem uma certa responsabilidade, os anos vão passando e começas a questionar-te: Será que eu posso continuar a fazer isto? Começas a duvidar muito quando acontecem estas coisas. Mas eu confio e tenho apoio dos meus pais e da minha família. Eu não tenho medo de trabalhar, eu não tenho medo dos desafios e nem de lutar. Se tivesse medo, não estaria a viver há 11 anos fora do país”.
Com a chegada da COVID-19 a Espanha, Mariana Carrilho teve momentos difíceis a nível profissional e financeiro. Dar aulas online foi o que a suportou. Entretanto, a mezzo-soprano vê algumas vantagens na pandemia: “A coisa positiva da pandemia foi a mudança de olhar sobre a comunidade, sobre a união humana e sobre o abuso ao planeta”.
Antes da pandemia, Mariana Carilho estava a trabalhar em três espectáculos, dos quais dois foram suspensos. O primeiro era especial porque a cantora lírica passou por audições, tendo sido seleccionada. O segundo era especial porque seria a primeira vez que cantaria no Palau de la Música Catalana de Barcelona. “Para quem não conhece, é uma das salas mais importantes para concertos de música clássica em Barcelona e na Europa”. O concerto cancelado seria com a orquestra de guitarra de Barcelona e a artista seria solista convidada.
Ultrapassadas as dúvidas durante o confinamento, para a mezzo-soprano, hoje em dia, “seguir as artes e cantar é um acto de fé e de verdade para comigo mesma”.
PERFIL
Mariana Carrilho é uma Mezzo-soprano e artista visual moçambicana.
Actualmente, forma parte do estúdio de ópera da Ópera de Sarrià, Barcelona.
Na próxima temporada, Mariana debutará como Mezzo-soprano convidada no Palau de la Música Catalana, cantando El Amor Brujo e Sete Canções Populares Espanholas de Manuel de Falla com a Orquestra de Guitarras de Barcelona. Esta temporada também lhe reserva o debut no Teatro de Sarrià como parte do elenco da Ópera de Câmara de Barcelona 2020/2021.
Na temporada passada, depois de terminar o seu mestrado com distinção, Mariana estreou profissionalmente como Venus na opereta Orphée aux Enfers de Offenbach no Teatro Avenida em Maputo, Moçambique, substituindo uma cantora que teve de abandonar a produção. Nesse mesmo verão, estreou como Dorabella em Così Fan Tutte, de Mozart, no Festival de Ópera de Villarreal, em Valência, Espanha como parte do estúdio de ópera organizado pelo festival.
Mariana Carrilho tem sido presença regular na Temporada de Música Clássica de Maputo, organizada pelo grupo Xiquitsi e Associação Kulungwana, por quem ela foi acarinhada desde seus primeiros passos na música. Através dessas oportunidades, ela conseguiu alcançar um público moçambicano que nunca tinha tido contacto com a música clássica. Mariana foi também convidada a ensinar bases de técnica vocal e consciência corporal aos estudantes do Xiquitsi.
Mariana Carrilho foi cantora activa em masterclasses de cantores e vocal coaches de renome como Cheryl Studer, Dolora Zajick, David Gowland, Sara Braga Simões, Eric Halfvarson, entre outros. Foi dirigida por maestros como Jose Olivetti, Josep Gil, Manel Valdivieso, Dinis Sousa e Sergi Vicente. Colaborou com aclamados directores de cena, tais como Paco Azorín, Paco Mir, Andre Heller-Lopes e Paulo Lapa.
Trabalha actualmente com Carmen Bustamante.