Quando os tamancos se comunicaram com o chão da terminal rodoviária da “junta” na periferia da cidade de Maputo, produziram um estrépito chamativo. O jovem que os calçava não se importou com os olhares folgazes de que era alvo.
Foi um dos últimos a desembarcar do autocarro interprovincial proveniente de Chókwè na província de Gaza.
Os seus admiradores miravam-no curiosos e deixavam escapar uma risada, o recém-chegado percebeu que criava impacto no seio das pessoas próximas.
– Onde apanho um chapa para a baixa? – questionou para um dos utentes da terminal rodoviária
Caminhou sereno segurando uma mala velha e pesada, usava um chapéu de palha com abas pequenas, a jaqueta de couro castanho desgastada e ligeiramente pesada descaía no ombro direito, exactamente do lado da mão que segurava a mala. A camisa de capulana com as cores amarelo e vermelho era suplantado pelo casaco, as calças eram de caqui verde-escuro.
Não demorou para embarcar no chapa, os passageiros abriram alas para deixa-lo passar admirando suas vestes, uma moça vagou o lugar e o ofereceu.
– Obrigado! – proferiu com um sorriso alegre no rosto.
O chapa marchava velozmente ultrapassando os outros carros, este malabarismo perigoso agradava a Carlos Wena que vinha pela primeira vez a cidade de Maputo com a mente repleta de sonhos que pretendia realizar. Vinha animado depois de receber o convite do seu primo que triunfara na grande metrópole.
O desembarque na baixa da cidade deixou-o atónito, olhava para cada canto da cidade intimidado pelos monstros de cimento que se erguiam por todo lado, os carros que circulavam velozmente dum lado para outro deixavam-no desorientado. Ficou parado por um tempo, estudando o ambiente que morava ao seu redor, temia dar um passo em falso que podia comprometer a sua chegada a grande cidade.
Posicionou a sua mala no chão, sentou sobre ela e procurou organizar as ideias, já passavam das 15h00.
Uma turba de petizes em gozo de férias escolares deu com o alegórico personagem de Carlos, pararam e olharam-no maravilhados, riam e trocavam conversa.
Já descansado pegou na sua maleta e iniciou a caminhada seguida de perto pelos meninos que multiplicaram as suas risadas agora que o viam em movimento.
A sua derradeira jornada seria até a casa do primo no bairro suburbano da polana caniço nos arredores da cidade.
Os meninos depois de consumirem momentos de alegria gratuita partiram para outras brincadeiras.
A vitrina com letras garrafais do nome do estabelecimento avivaram sua mente e recuperou uma imagem que guardava num canto especial da sua mente.
O jovem forasteiro entrou para o estabelecimento comercial, abeirou-se do balcão, descansou a sua mala no chão.
– Sim, se faz favor? Investiu o balconista.
Ainda distraído, o recém-chegado apreciou o ambiente que por ali morava durante um tempo e cabisbaixo falou para o balconista.
– Quero falar com o rei – disse convicto.
O balconista vigiou demoradamente o estranho cliente, e ainda perplexo perguntou:
– Como disse?
– Quero falar com o rei – repetiu o forasteiro seguro do que buscava.
Pela indumentária e o gesto meio aparvalhado, o atendedor ajuizou que o homenzinho devia estar desprovido de sanidade mental. Então decidiu embarcar na brincadeira.
– Meu senhor, somos um estado semipresidencialista, isto para dizer que temos um presidente que por coincidência foi reeleito a bem pouco tempo. – gabou-se o balconista dos seus dotes políticos.
– Mas eu quero falar com o rei! – insistiu sereno, o estranho cliente.
– Meu jovem, nós, a República de Moçambique não é uma monarquia. – frisou o balconista cada vez mais convicto dos seus saberes.
– Meu senhor, saiu na televisão a dizer que o rei chegou, até falam em inglês “the king is here” – assegurou Carlos sereno de que a sua explicação poderia elucidar o balconista.
Já meio irritado com a insistência parva do cliente, o atendedor procurou ignorar a investida do recém-chegado e deu atenção a um outro cliente.
Um curioso que destrinçava o diálogo entre o balconista e o pomposo cliente, processou a pretensão de Carlos, levantou-se e o abordou.
Depois de uma breve intersecção verbal, o curioso pousou teatralmente uma garrafa no balcão, Carlos abriu os olhos e largou um sorriso rasgado, segurou a garrafa que o ofereciam e agradeceu imensamente aquele anjo que soubera interpretar as suas aspirações.
– Eu sabia que o rei estava aqui! Afirmou felicíssimo – Muito obrigado mano.
E então bebeu, bebeu prazerosamente a cerveja.