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As verdades da mentira em Quelimane

Ao arrepio do regulamento de prova por si aprovado, e numa aceleração em contramão capaz de provocar estragos bem maiores que rinocerontes numa loja de porcelanas, a Federação Moçambicana de Basquetebol (FMB) ignorou as irregularidades cometidas pelo Desportivo de Tete ao utilizar sete reforços (da Liga de Chimoio) contra os dois da mesma associação permitidos pela agremiação na primeira jornada do Campeonato Nacional de juniores femininos, em Quelimane.

Acto contínuo, o comité técnico fez vista grossa ao “caso” do Sporting de Quelimane, que, na jornada inaugural, utilizou três atletas provenientes de outras associações provinciais, sendo duas do Desportivo Maputo e outra do Ferroviário da Beira. Tudo no afã de querer ganhar a qualquer custo.

Ou seja, no lugar de recorrer ao regulamento que prevê a aplicação de falta de comparência às equipas com má qualificação de atletas, o órgão reitor do basquetebol moçambicano, que devia ser o guardião da verdade desportiva, assobiou para o lado e deixou passar tamanho e grosseiro atropelo à verdade desportiva.

A mesma Federação Moçambicana de Basquetebol, e depois de a polémica vazar nas incendiárias e interventivas redes sociais, penalizou com derrotas a equipa masculina do Sporting de Quelimane por má qualificação de um atleta com idade acima do limite definido para disputar a prova. Isto, de resto, num caso de falsificação de idades que faz escola no desporto moçambicano. Perante, sem sombra de dúvidas, o olhar impávido das autoridades desportivas e não só. Imprime-se, às catadupas, bilhetes de identidade bem mesmo nas vésperas de provas.

Estamos, pois, perante um cenário de dualidade de critérios. E as questões que não querem calar, claro, são aqui convocadas: porque o comité técnico não teve a mesma mão dura para com o Desportivo de Tete e Sporting de Quelimane? Não gostam do jogo limpo? Advogam o cumprimento escrupuloso das regras por parte de uns e incumprimento por outros? Pura incompetência? Porque, se assim for, até podemos esquecer estes pontos e assim pensar: “perdoem pois não sabem o que fazem”.

E aqui, caros patrícios, a FMB não pode passar paninhos quentes ao emitir um lacónico comunicado no qual refere que a questão das penalizações passa a ter efeito a partir da segunda jornada da prova.

Quer dizer, este “nacional” de basquetebol de juniores masculinos e femininos, eivado de seriedade, tinha dois regulamentos de prova?

É papel e dever da FMB fazer respeitar os regulamentos e a verdade desportiva sob o risco de estas provas ficarem mais descredibilizadas do que já estão e perderem interesse por parte dos clubes. É só olhar para a tragicomédia que foram os “nacionais” de juvenis masculinos e femininos, em Xai-Xai. Quem vai investir, em momentos de orçamento magro, para disputar provas onde a verdade desportiva é uma miragem? O que estamos a transmitir ao empresariado quando apadrinhamos irregularidades?

Há, por outro lado, questões de fundo relacionadas com o que se pretende, de facto, com os campeonatos dos escalões de formação.

Em países mais sérios, objectivamente, estas provas afirmam-se como um espelho para potenciar e exponenciar novos valores, de mais a mais quando estamos num escalão de transição para os seniores. Como é que se pode garantir continuidade e consistência quando improvisamos, em duas semanas, uma equipa formada por atletas de outros pontos do país que somente vão jogar os “nacionais”? É este mesmo o caminho que queremos seguir para produzir atletas de referências? Porque não incentivar quem forma, de facto?

Não estamos a abrir espaço para cortar as pernas de um leque de atletas locais, muitas delas com potencial, que podiam estar a representar a sua província e/ou equipa? Não estamos a dizer, de forma indirecta, aos pais e encarregados de educação que o desporto é uma escola de batota? Que somente vence quem prevarica?

Mais do que olharmos para os 3500 Meticais que vale cada inscrição de atletas, devemos ter a consciência de que ninguém mete dinheiro.

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