No primeiro dia deste ano, Chico António programou-se a voltar ao estúdio para continuar a produzir o seu novo álbum. Apesar da saúde frágil, o músico contactou o produtor Zé Pires. Ambos trocaram mensagens, animados, convictos de que 2024 seria o ano… No entanto, em poucos dias, a situação da saúde complicou-se e o artista teve de ser internado no Hospital Central de Maputo, onde, este sábado, não resistiu ao cancro que se tinha espalhado pelo corpo.
Como consequência da morte de Chico António, em poucas horas, as redes sociais funcionaram como a grande montra para a homenagem ao autor de “Maimuna” e “Mercandonga”. Os admiradores, amigos, colegas de trabalho e artistas lamentaram, com efeito, o desaparecimento de um autor cujo último grande concerto aconteceu no dia 22 de Dezembro, no Centro Cultural Moçambique-China. Zé Pires esteve na direcção do espectáculo designado Aqueles dias de rádio. “Eu tive essa sorta de ter sido escolhido por ele, para trabalhar. Fiz a finalização do último disco dele, Memórias, e, recentemente, ele escolheu-me para fazer a produção-executiva do seu último álbum, numa co-produção minha com o Nelton Miranda. Infelizmente, passados dois ou três dias, recebemos esta mensagem de que o Chico está hospitalizado e, pasado uma semana, o Chico foi-se. Mas nós vamos finalizar o trabalho. Não vamos permitir que o legado do Chico morra com ele. Faremos com que o seu projecto vá até ao fim. Disso eu tenho a certeza”, garantiu Zé Pires, acrescentando que, nestes dias, percebeu que, já a 22 de Dezembro, o autor de João Galagala estava debilitado.
Reagindo à morte de Chico António, Lucrécia Paco lamentou à perda de uma referência para a cultura moçambicana. Do mesmo modo, a actriz lembrou-se da sua adolescência e de um período em que ela e Graça Silva foram dançarinas do Tio Chico. “O país perde não só um artista, um mestre da música, mas também um professor da vida e uma referência que, ao longo do seu percurso soube, com muita dingnidade, ter em conta o ser artista, que questiona e não se alheia do meio em que se insere”.
No mesmo calor de choque, Elvira Viegas sublinhou: “Esta situação nos deixa tristes. A mim, pessoalmente, que o conheço há muitos anos e partilhamos o palco juntos… Estou triste e revoltada, ao mesmo tempo, porque não passam dois meses que perdemos Leman Pinto, outro grande músico”.
Para o amigo Nataniel Ngomane, que o conheceu há quase 30 anos, Chico António é um autor diferenciado. E explica porquê: “A guitarra de Chico António não é qualquer pessoa que toca, pois tem uma escala específica, quer dizer, não é uma escala Ocidental que nós conhecemos, e, nesse aspecto, poderia comparar Chico António com José Mucavele. E este é um caso muito curioso. Como é que um indivíduo inventa uma escala?”.
De acordo com José Mucavele, “Perdemos um grande artista, que estava a aguentar-se porque a arte é uma grande luta num país sem cultura de cultura. Eu não conheço um músico do calibre de Chico António, lá fora, mais pobre do que Chico António”.
Ainda sem data do funeral, os artistas são unânimes numa coisa. Desde já, os estudiosos devem se preocupar em estudar e valorizar a obra de Chico António.