A multinacional Mozal está em negociações com o Governo de Moçambique, no sentido de prorrogar o contrato de fornecimento de energia eléctrica, uma vez que o vigente termina em Março do próximo ano. A Mozal adquire anualmente 950 Megawatts de energia para o seu funcionamento normal.
De acordo com um documento partilhado pela empresa, as negociações decorrem desde o ano passado e ainda não há consenso entre as partes, o que faz com que a empresa viva na incerteza sobre o futuro do fornecimento de energia, apesar de ter como segunda opção a Eskom.
Uma resposta satisfatória para a renovação do contrato parece estar longe de se concretizar, tudo porque o Governo de Moçambique veio a público apresentar a sua visão no tocante ao contrato. Inocêncio Impissa, porta-voz do Executivo, disse, durante a vigésima quinta sessão ordinária do Conselho de Ministros, que a Mozal deve passar a adquirir a energia junto da Electricidade de Moçambique, empresa instituída para a venda no país.
Com base nas novas regras do jogo que o Governo quer estabelecer, a tarifa deverá ser definida de forma a tornar o contrato viável e sustentável, evitando impacto negativo na operação da fábrica.
A posição do Executivo significa que o formato da comercialização da electricidade para a Mozal muda drasticamente, abandonando-se os modos antigos em que a empresa adquiria directamente a energia à Hidroeléctrica de Cahora Bassa, através de um gerador posicionado na hidroeléctrica.
Continuamos a dialogar com o Governo da República de Moçambique, a HCB e a Eskom para garantir o fornecimento de electricidade acessível para permitir à Mozal operar para além de Março de 2026 e manter o seu substancial contributo para a economia de Moçambique”, lê-se num comunicado da South 32 o maior accionista com 63,7 por cento.
AFINAL, O QUE SIGNIFICA A MOZAL PARA A ECONOMIA MOÇAMBICANA?
A Mozal contribui com aproximadamente 3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e é uma importante empregadora industrial, gerando empregos para milhares de funcionários e contratados. O seu peso financeiro é de mais de 43 mil milhões de meticais. As contribuições da Mozal aos cofres do Estado não ficam por aqui: a empresa encaminha dividendos aos cofres nacionais por o Estado ser detentor de 3,9% do capital social.
De acordo com a Conta Geral do Estado de Moçambique, em 2022 a Mozal pagou 839,8 milhões de meticais em dividendos ao Estado e, no ano seguinte, reduziu cerca de 560 milhões de meticais, tendo conseguido transferir cerca de 274 milhões de meticais. Entretanto, em 2024, a empresa não pagou dividendos ao Estado devido aos prejuízos averbados.
REPENSAR O CONTRATO DE FORNECIMENTO DE ELECTRICIDADE À MOZAL É NECESSÁRIO, DIZ JOAQUIM DAÍ
Reagindo ao assunto durante o programa O País Económico de ontem (quinta-feira), o economista e gestor Joaquim Daí disse ser urgente a mudança dos termos do contrato entre o Estado moçambicano e a Mozal, para melhor controlo do negócio, concordando com a proposta do Governo que defende que o negócio deve ser feito directamente com a Electricidade de Moçambique.
Segundo o economista, durante 27 anos, a multinacional do alumínio beneficiou de um contrato especial de fornecimento energético a preços preferenciais, sem intermediação da Electricidade de Moçambique, uma situação que enfraquece o papel da empresa pública no sector.
“De que vale termos uma EDM, se as entidades não compram energia da EDM?”, questionou o economista, acrescentando que a empresa estatal deve ser reposicionada como fornecedora central de energia para todos os sectores estratégicos.
Daí reconheceu que a Mozal continua a ter um peso relevante na economia nacional, representando cerca de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) e sendo uma das maiores exportadoras do país. No entanto, frisou que a sua contribuição fiscal é “extremamente limitada”.
“A Mozal não paga IVA nem direitos de importação sobre bens de produção, e os dividendos do Estado, que detém apenas 3,9% das acções, são insignificantes. Em 27 anos, a empresa contribuiu com apenas 3,2 milhões de dólares em dividendos. Isso é quase nada”, afirmou.
A instabilidade no fornecimento de energia, registada principalmente no último trimestre de 2024, teve impacto directo na produção da Mozal e reflectiu-se na performance económica do país. Segundo o economista, houve uma quebra de cerca de 4,9% na contribuição do sector industrial para o PIB, anulando o crescimento registado nos trimestres anteriores.
Face a este cenário, Daí defende que o Estado deve adoptar uma abordagem estratégica e dialogar com os megaprojectos para rever cláusulas contratuais, mesmo sem recorrer à força legal. “Não é uma questão de legalidade, mas de interesse nacional. Temos que explicar por que razão os contratos devem ser ajustados às novas exigências do país”, argumentou.
O gestor apela ainda à diversificação das fontes de energia e à aposta em projectos como Mphanda Nkuwa, gás natural e outras centrais hidroeléctricas, para garantir maior capacidade de produção interna e autonomia energética.