Sinto que a minha alma está a sair de mim. Mas eu estarei sempre aqui, mesmo sabendo que carrego a escassez de emoções e pensamentos capazes de trazer o sorriso do mundo nas madrugadas da vida, ao som dos assobios das gaivotas.
Sinto que a consciência social se afasta do banquete que celebra a paz – onde o ritmo da música, que canta os valores esquecidos, mexe no silêncio das almas que ainda sonham com um mundo bom, sem os vícios que disfarçam as carícias da pobreza.
Sinto a minha alma a sair porque, por vezes, estou no mundo apenas a atrapalhar as vocações dos escolhidos, alimentando o muro egoísta do talento que tanto anima o meu Eu. Isolo-me da vida social, deixo de proteger o Eu do outro e esqueço de cuidar da carne que protege a minha própria alma.
Deixo de oferecer rosas aos que me cercam, de agraciar as almas com o perfume do pólen que alivia o sofrimento e protege os corações doces com as pétalas macias do bem.
Sinto que a minha alma já não anima as almas da juventude com o buquê de oxigénio que
recorda o tempo de criança. A minha alma esquece-se de dizer “sim” à vida, quando o dia traz o sol da esperança.
Sinto em mim uma alma deficiente, por não saber oferecer um enxoval de tempo que cubra o coração bom que sustenta uma alma cansada.
Mas repito, como um dia escrevi: estou aqui.
Se eu conseguir viajar, para onde quer que for, levar-te-ei comigo, ó minha alma. Onde eu estiver, acomodar-te-ei no berço de paz que descansa na esquina nobre do meu modesto coração.
Onde eu estiver, irás contar comigo as experiências belas que partilhámos, nessa matemática estranha que tenta calcular o sentido da vida social, cheia de incógnitas.
Sinto a minha alma a murmurar que a palavra “esperança” foi inventada para distrair o universo e fazer o tempo de a vida passar, sem que se questione a razão de certas emoções, satisfações ou mesmo de alguns fenómenos.
A minha alma compreende, em metáfora, que a esperança é a palavra mágica que transforma o difícil de viver no suportável de continuar. Esperança é o termo que sustenta o futuro, uma palavra que acomoda a alma. Mas as almas mais atentas percebem que “esperança” e “futuro” são talvez termos de consolo divino, que germinam paz interior e acalmam o silêncio de viver… sem olhar de ver, sem questionar o presente.