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A cidade de Maputo merece uma feira de livro

Digo e volto a dizer, e se necessário digo de novo: a cidade de Maputo, a capital deste deveras iliterário país, merece uma feira de livro! Pois, aquela a que se (des)organiza pelo Conselho Municipal, no Jardim Tunduro, não é, e não deve ser tratada como tal. Participo desta desordem desde que a mesma passou a ser realizada na praça da independência e posteriormente neste botânico jardim. Destas participações retive, como ilações, o festim de reclamações dos envolvidos, desde os escritores, ou autores, os expositores, até ao público, que a cada ano tende a não afluir naquela que deveria ser a principal festa do livro em Moçambique.

A desordem do município de Maputo, a falta de preparação do pessoal para lidar com a arte, a insensibilidade e o desrespeito destes desorganizadores para com os artistas, aliada a uma nítida aversão ao livro, fazem desta “feira” um verdadeiro festival de mediocridades.

Esta desorganização que o município organiza é cheia de peripécias adversas que se opõe aquilo que seria uma verdadeira feira de livro, literalmente falando. Vários são os aspectos que não fazem sentido nenhum. Para melhor ilustrar estas atrocidades vamos por pontos:

1) Para mim, e para qualquer um que viveu essa balbúrdia, não faz sentido que uma instituição, como o Município de Maputo, organize debates ou qualquer outro evento em que os protagonistas, no caso da feira os oradores e moderadores, não tenham informação nenhuma relativa a participação destes, o que é facto lamentável na feira de livro de Maputo.

2) Em relação ao convite de escritores ou autores de outros quadrantes do mundo, para que possam participar da feira, é óbvio que estes trazem mais-valia a este evento, porém, não faz sentido que o município convide-os e não consiga prestar-lhes qualquer apoio logístico, como a passagem, alojamento, transporte, alimentação, entre outros. Isto é ultrajante, sabe o Município que imagem passa de Moçambique para o mundo com essa atitude covarde e burlesca?   

3) Não faz sentido, que haja uma feira de livro em que o preço do livro continue o mesmo das livrarias e, nalguns casos, mais caro ainda que o habitual. A questão que faço é simples: Como o município de Maputo, com todos aqueles parceiros que se exibem nos materiais promocionais, não consegue encontrar meios de subsidiar, ou seja o que for, para que os expositores baixem os custos dos livros? Para mim o conceito de feira é promoção do livro. E promover algo é tornar mais acessível. Se não há acessibilidade do livro então não estamos perante uma feira, simples quanto isso.

4) Também não faz sentido que o Município celebre contractos com os envolvidos nas actividades da feira, como artistas e outro pessoal, e este mesmo Município não cumpra com aquilo que se predispôs a obedecer, como é o caso dos miseráveis cachês que levam séculos para que os artistas recebam. Não faz sentido!  Ou não assinem contractos com os artistas, ou então assinem e cumpram com a promessa, ora bolas!

5) Não faz sentido que o município de Maputo, com a estrutura e os meios logísticos que detém, não consiga divulgar o evento para que haja adesão massiva de visitantes, porque é extremamente penoso que um escritor ou estudioso de qualquer área de saber, se prepare, se dê trabalho de fazer uma pesquisa e, no final das contas, fale para uma plateia de cadeiras vazias, que é o cenário característico da “Feira de Livro de Maputo”. Tudo bem que os índices de literacia em Moçambique são baixos, mas o quê é que o município e os seus parceiros de cooperação para realização da feira têm feito para contornar esse fenómeno? Será que existem parceiras com o Ministério da Educação, com as Universidades, as Escolas? Se não é melhor que se pense nisso.    

Bom, eu posso esgotar todos os números e suas possíveis combinações, arrolando os aspectos que não fazem sentido na “Feira de Livro de Maputo”, porém tenho piedade dos meus dedos e teclados, a verdade é que esta feira, nos moldes em que se (des)organiza, não faz qualquer sentido, e essa atitude não só tira o mérito aos (des)organizadores, como também a todos nós citadinos desta urbe.
Se nós, os que moramos nesta cidade, realmente queremos uma feira de livro, no sentido literal da palavra, precisamos repensar esta desordem, todos nós que gostamos de ler e que estamos de alguma forma ligados ao livro, como os próprios escritores, leitores, artistas, livreiros, jornalista, associais culturais, fundações artísticas, todos devemos unir sinergias para que a próxima edição seja uma verdadeira “festa” do livro, só assim estaremos a dar um passo significativo para literacia do país. Só espero que haja abertura por parte do município, se não for por essa via, é minha opinião que se não continue com a (des)organização nestes moldes.

Já nos bastam as adversidades sociopolíticas que nos roubam o sono e nos destroem a esperança, precisámos que o livro seja esse tubo de escape para que possamos voltar a sonhar, e quiçá reconstruir novos horizontes, algo que este país tão sofrido quanto empobrecido precisa. E os novos horizontes, meus caros, abundam nos livros. Então, não nos livrem do livro!

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