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Criação do Banco de Desenvolvimento divide opiniões sobre estrutura accionista e modelo de fiscalização

O processo de auscultação pública para a criação do Banco de Desenvolvimento de Moçambique (BDM) entrou numa fase decisiva e continua a revelar divergências entre especialistas, empresários e representantes do sector financeiro. A auscultação realizada esta quinta-feira, em Maputo, juntou o Ministério das Finanças, gestores bancários e diversos agentes económicos para discutir o desenho institucional, o papel do Estado e os mecanismos de supervisão da futura instituição.

A iniciativa, conduzida pelo Ministério das Finanças, visa recolher subsídios que permitam consolidar o anteprojecto antes da sua submissão às instâncias decisórias. 

Na ocasião,  o Gabinete Central de Reformas e Projectos Estratégicos reafirmou que a criação do BDM exige fundamentos sólidos e alinhados às melhores práticas internacionais. Representando a instituição, a gestora de reformas, Iara Melo sublinhou a necessidade de um enquadramento legal robusto.

“Para o sucesso do Banco de Desenvolvimento, deve-se apostar na disciplina institucional e numa lei específica que torne o banco resistente e funcional. Só com regras claras conseguiremos evitar desvios e garantir que a instituição responda ao interesse público”, afirmou Melo.

Do lado do sistema financeiro, o economista-chefe do Millennium bim, Oldemiro Belchior, o maior risco na criação de um banco de desenvolvimento reside na interferência política. “Este banco deve nascer com uma governação blindada. O processo precisa de pouca influência política e de maior envolvimento das instituições financeiras para mobilizar capital de forma sustentável”, defendeu.

Belchior chamou ainda atenção para a importância da meritocracia interna e da transparência na concessão de créditos. “É fundamental evitar qualquer tipo de clientelismo na selecção de funcionários e das entidades que vão apoiar o processo de crédito. Um banco de desenvolvimento não pode transformar-se num instrumento de favorecimento, mas sim num motor de crescimento”, alertou.

Entre os empresários, destacou-se a intervenção de Agostinho Vuma, presidente da Fundação para a Competitividade Empresarial (FUNDEC), que vê no banco um instrumento crucial para dinamizar a economia nacional e corrigir assimetrias regionais.

“A criação deste banco é uma necessidade estratégica para o desenvolvimento nacional. Temos províncias estagnadas há décadas e um mercado que não responde às necessidades do sector produtivo. O banco poderá reduzir desigualdades, colmatar falhas de mercado e fortalecer o conteúdo local”, afirmou Vuma.

O empresário acrescentou que, sem financiamento adequado, muitos projectos com potencial de impacto social e económico nunca chegam a sair do papel. “O país precisa de um banco com visão de longo prazo, capaz de financiar sectores estruturantes que os bancos comerciais não priorizam”, reforçou.

O ponto que mais dividiu os participantes foi a estrutura accionista e o modelo de fiscalização. Alguns especialistas defenderam uma estrutura híbrida, combinando capital público e privado, como forma de equilibrar eficiência e interesse nacional.

Melo explicou que o Estado poderá deter a maioria das participações, mas esta posição não é consensual. “Estamos a analisar vários modelos, mas entendemos que a participação maioritária do Estado pode assegurar estabilidade estratégica. Ainda assim, reconhecemos a importância de escutar outras sensibilidades”, acrescentou.

Para Vuma, o estado não pode ser o accionista maioritário para redução de influências na gestão do banco. Ainda propõe que o Banco de Moçambique não deve assumir a supervisão do futuro BDM dada a natureza particular dos bancos de desenvolvimento.

Encerrando o encontro, João Macaringue, representante do Ministério das Finanças, apelou a uma postura aberta e proactiva diante dos desafios. “Não devemos temer o novo. Há experiências bem-sucedidas em vários países e devemos aprender com elas, adaptando os modelos às nossas realidades”, enfatizou.

Macaringue assegurou que todas as contribuições recolhidas serão incorporadas na versão final do projecto. “Queremos um banco que responda às necessidades do país, equilibrando prudência financeira com ousadia estratégica”, concluiu.

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