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12 de Outubro: A festa entre lamentações

Celebra-se esta sexta-feira o 12 de Outubro. Dia do professor. Instituída em 1981, a data serve para reflectir sobre a carreira docente, mas também para celebrar as poucas alegrias que o professor tem na profissão.

O dia 12 de Outubro é um dia diferente em practicamente todas escolas do país. Actividades culturais, desportivas e convívios farão das escolas locais diferentes daquele mar de dificuldades que caracteriza a maioria delas.

Com efeito, os professores constituem a maioria dos funcionários públicos do país, trabalham em practicamente todas aldeias de que o país tem registo e nalgumas continuam a autoridade moral e intelectual que já foram nos anos passados.

Viveram os tempos mais difíceis do país durante todos os conflitos armados e tal como reconheceu o presidente da República na recepção aos representantes da Organização Nacional de Professores (ONP) por ocasião da passagem desta data, na terça-feira passada, eles tem sido forçados a vida de nómadas em tempos de conflito Armado.

Regra geral, são pouco exigentes em termos de conforto e condições de trabalho. Vivem e trabalham com e nas comunidades em que estão inseridos e muitas vezes volvidos vários anos de coexistência, poucos conseguem perceber que o professor fulano, não é oriundo da região em que se encontra a trabalhar.

A sua formação profissional reflecte exactamente aquilo que o sector de educação tem sido desde a Independência: um laboratório de experiencias nem sempre bem-sucedidas.

 Já deram aulas sem nenhum tipo de formação, depois passaram a ter pequenas capacitações e seguiram-se diferentes cursos que foram desde a sexta classe mais um ano, mais dois anos, a nona classe mais um ano, depois mais dois anos e depois mais três. Mais recentemente foram introduzidos cursos como o da décima classe mais um ano, depois mais dois e ainda a décima segunda mais um ano. Tudo isto para leccionar no ensino primário.

A formação de professores para o ensino preparatório e secundário também não foi sempre consistente até ao surgimento do Instituto Superior Pedagógico, mais tarde, Universidade Pedagógica. Muitos estão recordados da Faculdade de Educação ou das EFEPs, que já foram considerados por alguns especialistas em educação, como os momentos de glória na formação de professores no pais e que forjaram os melhores professores de que o país se pode orgulhar registo no pós independência.

Foram depois colocados em praticamente todos distritos do país nos princípios da década 80 e muitos nunca mais voltaram. Foram recebidos pela guerra nalgumas zonas, muitos morreram, outros fugiram e nunca mais se apresentaram ao ministério da Educação. Outros há, porem, que por heroísmo, resignação ou falta de condições para regressar a terra de origem, permaneceram nas suas escolas até a sua destruição ou transferência para regiões relativamente mais seguras. Desses alguns conseguiram transferência para as capitais e formaram-se em instituições de ensino superior, mas outros, lá ficaram e estão até hoje.

Vieram as novas carreiras e remunerações. A classe docente estratificou-se. O que teve a sorte de concluir o nível médio melhorou de salário, o que permaneceu com a sexta mais três anos passou a ser chamado professor D e os que não tiveram a sorte de passar da sexta classe foram designados professor E. Apesar dos seus longos anos de experiencia, passaram a ganhar os mais míseros salários da carreira docente. Alguns ficaram frustrados, envolveram-se profundamente no álcool e essa foi a causa da sua morte.

Os tempos mudaram e governo procurou termos mais simpáticos para o professor. Passaram a ser docentes N1,N2,N3,N4., sendo o N1 o que tivesse o mínimo de licenciatura e o N2 o que tivesse o bacharelato. Daí introduziu o humilhante subsídio que chamou de incremento salarial, um valor três vezes superior ao salario, destinado apenas a professores com formação superior. Uma autêntica humilhação para os outros professores que faziam a mesma coisa, no mesmo lugar, porem sem direito ao tal subsídio. A coisa não era sustentável e nem era de boa educação, apesar de vir sob pretexto “de forma de reter quadros superiores no sector”. Desapareceu alguns meses depois.

Hoje, já sem toda autoridade que outrora teve o professor “vira-se” como pode para fazer face a carestia da vida. O facto de constituir a maioria dos funcionários públicos faz com que o seu reajustamento salarial seja mínimo apesar das condições difíceis em que tem que trabalhar. Tem como regra turmas sobre lotadas e tem sobre si a responsabilidades de transmitir conhecimento suficiente para os alunos passem de classe. Alias, tempos houve, em que nenhum professor devia apresentar um aproveitamento inferior a 75 porcento.

A propósito disso o então Ministro da Educação Aires Ali, teria dito na altura que essa exigência não tinha nada demais porque “a reprovação de um aluno é uma excepção. O normal é que os alunos passem de classe e não o contrário”, o que por outras palavras significa que o professor que apresenta várias reprovações estaria apresentando um resultado que é um excepção e não a regra, pelo que era justo que dele se cobrassem explicações.

Actualmente não se exigem os 75 porcento (pelo menos de forma explicita), mas “apela-se” aos professores para que tenham um aproveitamento positivo. Afinal há sempre novos alunos que precisam de salas que não podem ser eternamente ocupadas por repetentes.

O regulamento de carreiras e remunerações na função pública estabelece promoções e progressões regulares que em muitos casos não acontecem ora por falta de cabimento orçamental ou por negligência de alguns gestores.

Os níveis de motivação dos docentes não são dos melhores, os salários, mesmo dos que tem formação superior são cada vez mais fracos no mercado e quase sempre, os professores tem que ter aulas extras para compensar o deficit. Surgiram por isso os professores turbo. O governo não gostou e mandou cancelar os contractos que tinha com os professores que já eram efectivos no estado. É uma medida que foi bastante contestada na altura. Não se sabe ainda até que ponto a mesma contribuiu para a melhoria da qualidade de ensino ou para o desempenho dos professores que em termos práticos ficaram sem uma fonte de renda.

E porque professores sempre foram necessários, muitos enveredaram pelas horas extras que entretanto provocaram os problemas que até hoje existem devido ao atraso no seu pagamento. Os mais fracos de espirito enveredaram pela corrupção, acto indigno para um profissional de quem a comunidade não espera, senão, um exemplo de vida.

Enfim, uma reflexão sobre a vida e as condições de trabalho dos professores se precisa. Na verdade mais do que uma reflexão, soluções práticas que motivem o professor deviam ser implementadas para que esta nobre profissão não seja uma sala de espera para aqueles “que ainda não encontraram o que fazer”.

O sector de educação em Moçambique é tido nos planos do governo como prioritário.

Mas prioritário não pode ser o sector de educação, quando o seu actor principal, o professor, não é! Feliz dia senhor professor.

 

 

 

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