O País – A verdade como notícia

TQS: tentativa, queda e superação! A epopeica narrativa dos Mambas

Foto: CAF

Terminou, segunda-feira, a participação dos Mambas no Campeonato Africano de Futebol (CAN). Não poderia ter sido doutra maneira. A selecção nacional arrastou consigo um gigante do futebol africano, o Gana.

Um empate a duas bolas, porém irrisório nas contas finais, amputou o sonho de uma nação, que perante as bem conseguidas exibições do conjunto moçambicano mantinha acesa a sagrada esperança de sonhar com um lugar na fase seguinte da prova.

Contas à parte, a verdade é que, vista à lupa, a participação dos Mambas no CAN deixou muitas lições, que, bem aproveitadas, podem tornar o país mais respeitado ainda. Moçambique não deve nada a ninguém no contexto do futebol africano.

África e o mundo testemunharam o quanto a obstinação pode aglutinar sentimentos, afagar corações e, mais do que isso, fazer levitar uma nação antes vista a palmilhar num asfalto com sola gasta. Doravante, já não se pode falar do futebol do “Berço da Humanidade” e simplesmente fingir-se “demência” perante a existência de uma bandeira com cores reluzentes.

Moçambique exibiu-se, não apenas pelo esteticismo e sinfonia do Hino Nacional, a Pátria Amada, mas também pela vontade de querer fazer história, de construir uma nação convergente e, sobretudo, de carregar um sonho dos mais de 30 milhões de moçambicanos numa só força. A prestação da selecção nacional no CAN pode ser vista em três dimensões: tentativa, queda e superação!

 

TENTATIVA

Arredados do convívio dos grandes há 14 anos, os Mambas voltaram, meritoriamente, a fazer parte da plêiade do futebol africano. Calhou-nos um colosso para orientar o baptismo do nosso regresso à maior festa do desporto-rei a nível continental: o Egipto.

Era expectável, olhando para o seu palmarés, que os “faraós” despachassem os Mambas. Moçambique apresentou-se destemido, mais confiante no seu trabalho e longe dos complexos de inferioridade. Masoquista e habituada a dar a volta por cima, a selecção nacional sofreu um revés ainda na alvorada do jogo, ao consentir um golo.

Os Mambas não desistiram da luta. Foram atrás do prejuízo e, como sempre, o esforço é recompensado. O combinado nacional chegou ao empate através de Witti. Tudo em aberto. Autêntica bala de prata de Chiquinho Conde, Clésio Baúque, com uma nota artística, deu viragem ao marcador, apontando o segundo tento para o conjunto moçambicano.

Era o renascer da esperança. Com muita galhardia, os jogadores deixaram tudo em campo, mas, num lance estranho, o árbitro da partida, com a ajuda do videoárbitro, viria a sentenciar a partida. Coube a Mahomed Salah, estrela do gigante Liverpool, assinar a sentença, convertendo a grande penalidade. Foi doloroso!

O empate a duas bolas castigava o esforço dos Mambas, que tentaram tombar um gigante africano. Tentaram, acima de tudo, abrir uma nova página no histórico de participações no CAN. Moçambique esteve perto de alcançar a sua primeira vitória na prova. Ficou a tentativa.
QUEDA

Depois do agridoce empate diante do Egipto, a selecção nacional tinha pela frente o Cabo Verde, numa autêntica “cimeira” lusófona. Os cabo-verdianos vinham de uma vitória diante do poderoso Gana.

Moçambique tinha noção de que, vencendo esta partida, tinha uma réstia de luz para sonhar com uma possível qualificação para os oitavos-de-finais, embora para tal fosse imperioso derrotar o Gana na última jornada do grupo. Os “Tubarões Azuis” apresentaram-se na sua melhor versão, ainda que longe de um futebol arrebatador.

Um erro clamoroso de Ernani Siluane permitiu que os cabo-verdianos se adiantassem no marcador. Duro golpe para os Mambas, que faziam tudo de forma atabalhoada. Longe da postura apresentada na partida inaugural contra os “faraós”, o combinado nacional não conseguiu parar a avalanche do Cabo Verde.

Num outro erro descomunal de Edmilson Dove, os “Tubarões Azuis” chegaram ao segundo golo, tento que complicou ainda mais a situação dos Mambas. A apatia em todos os sectores da equipa e a inércia na abordagem do jogo fizeram com que o combinado nacional se limitasse a defender.

O Cabo Verde continuava a jogar no limite do erro do conjunto moçambicano. Moçambique voltou a claudicar, consentindo o terceiro golo. Ficou complicado. De uma selecção que arrebatou corações contra o Egipto passava a deixar uma outra imagem. Foi uma queda, das enormes.

SUPERAÇÃO

O jogo contra o Cabo Verde foi de má memória para a selecção nacional. Era preciso, por isso, mudar o rumo da história. Pela frente, Moçambique tinha de vencer, a todo o custo, o todo-poderoso Gana, ferido no seu orgulho depois de somar um empate com o Egipto.

Uma entrada periclitante diante das “Estrelas Negras” permitiu que os Mambas sofressem um golo nos instantes iniciais, num lance em que Infren Matola derrubou um adversário na grande área.

Mais uma vez, à semelhança do que aconteceu no jogo inaugural, os Mambas foram obrigados a correr atrás do prejuízo. Apesar do esforço empreendido, não conseguiam atinar com a baliza do Gana. Antes pelo contrário, as “Estrelas Negras” chegaram ao segundo golo, mais uma vez numa situação de grande penalidade. O sonho de chegar aos oitavos-de-final parecia cada vez mais utópico.

Aguentaram-se. Os Mambas discutiram o resultado, até que se beneficiaram de uma penalidade bem cobrada por Geny Catamo. O caminho da superação estava aberto. De cabeça, Reinildo Mandava encarnou o rosto da superação empatando a partida.

Já não havia muito por se fazer. Mas ficou uma lição, a capacidade de superação da selecção nacional nos momentos mais tenebrosos. Superaram, não só o resultado, assim como as tendenciosas arbitragens.

A selecção nacional poderia ter alcançado outros voos. Ainda assim, sai da competição de cabeça erguida. Para trás fica uma epopeica narrativa, que, com mais sorte e uma dose de experiência, poderia ter sido escrita em pergaminhos de ouro. Valeu pela superação.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos